segunda-feira, 29 de março de 2010

O quarto poder ou o moderno Coliseu?














Há muitos anos venho indignada com o modo que a mídia pode produzir efeitos jurídicos.

É óbvio que a morosidade processual, enquanto problema crônico da solução de litígios de qualquer área, civil ou criminal, oferece como fruto o descontentamento popular, todavia, um erro não justifica o outro muito maior, que é o de atribuir às emissoras de televisão e congêneres, um poder público absoluto, capaz de decidir e condenar qualquer cidadão em cinco minutos de exposição.

Não se trata, portanto, de avaliar particularmente e humanamente o mérito de tragédias demandantes de solução judicial, mas de conter por absoluto comprometimento dos atos de justiça, a influência dos que recebem muitos, mais MUITOS MILHÕES à custa do sofrimento e do sangue alheio, numa autêntica reprodução moderna do antigo Coliseu de Roma.

Dentre o povo que se submete cegamente a esse tipo de poder, não podemos esquecer, estão os serventuários da Justiça, pessoas obrigadas ao critério fundamental de isenção e impessoalidade ao qual se sujeitam todos os atos públicos!

Quando se admite irrestritamente o comprometimento desta isenção em troca de milhões em audiência, uma corrupção implacável se instaura, sendo certo que o Coliseu que se reproduz, demonstra que se o direito evoluiu aos humanos, os humanos não evoluíram ao direito e continuam a sentir prazer com a desgraça alheia, sem se aperceber que um dia, talvez, eles mesmos sejam levados a esta arena insana e irresponsável, sem que nenhum direito possa lhes acudir.

É “Alea jacta est”, famosa frase de Júlio César, literalmente correspondente a “A sorte está lançada”, cujo significado histórico serve a fatores determinantes de um resultado já realizado.

Júlio Cesar desprezava o Senado, lançava-se aos crimes de guerra e desafiava a lei buscando obter para si uma imunidade que não merecia, mas tinha. Viva a Rede Globo de Televisão, o repórter Pimenta das Neves etc.!

Não quero aqui, presentear nenhum bandido com imunidade, mas gostaria de registrar como cidadã e profissional do direito, o meu repúdio ao quarto poder instaurado num pseudo Golpe de Estado legitimado pela inconsciência popular, onde alguns são crucificados e outros não, enquanto este usurpador enriquece calmamente e sem nenhum dever de retribuição, nem mesmo ética, aos súditos.

Jussara Paschoini

quarta-feira, 10 de março de 2010

Razão, emoção e honestidade para todas as relações








Vivemos em um mundo que privilegia as criações da razão e seus efeitos e que sofre com a carência emocional.

A razão e a emoção sempre foram tratadas de forma antagônica, são rivais desde os tempos ancestrais na interpretação dos fatos e na tradução das tragédias.

Considerando, contudo, que tanto a razão quanto a emoção são portadas pelo ser humano, homem ou mulher, cumpre definir o que é um e o que é outro e eis a questão...

A razão é o diferencial humano instrumentalizado pelo pensamento com a finalidade de atender as mais variadas demandas da vida.

A emoção é também o diferencial humano instrumentalizado pelo sentimento como forma de reagir as mais variadas demandas da vida.

Não seria ousado dizer que a razão é ação e a emoção é reação, em uma se detém o poder e em outra não.

Não é difícil entender o porquê da oposição entre razão e emoção... são mesmo bem distintas em essência.

Nesta linha de pensamento é possível estabelecer que o poder esteja na razão e se a emoção é o seu oposto, nela impera a ausência de poder, o vazio, o inexplicável, todos prontos para reagir ao que quer que seja.

Enquanto uma age a outra reage, a ordem dos fatores não modifica tal fato.

Prosseguindo, o que se pode deduzir deste antagonismo natural é que aqueles sob o domínio da razão têm sempre mais poder e aqueles sob o domínio da emoção não... Será?

Será, não, é, o poder é matematicamente vinculado à razão, portanto quando o critério for poder, nem há que se falar em antagonismo, a razão é, por essência, vitoriosa.

Ocorre que, o poder só se presta aos objetos e fatos aos quais se relaciona, sem mundo exterior, o poder é infrutífero e sem sentido e é aí, no mundo exterior, que a emoção arrebata a cena, porque é nela, que a reação pode acontecer...ou não...

Num silogismo mais ou menos perfeito a razão tem um poder absoluto que é nulo em si sem o sentido que vem da emoção.

Há pois um antagonismo de interdependência inquestionável entre razão e emoção, uma tensão necessária entre dois pólos opostos para produção daquilo que creio poder chamar de energia vital.

Religião à parte, creio ser isto o que Jesus queria mostrar quando disse que “nem só de pão vive o homem”.

Fixado que a tensão entre razão e emoção é a fonte de energia vital do ser humano, é de se notar que a intensidade desta tensão não produz mais ou menos energia vital, trata-se de uma tensão necessária mas indeterminada em si, na medida em que depende do mundo exterior pelo componente emocional.

Assim, o ser humano tem razão e emoção tensas entre si, produzindo energia vital conforme relação com o mundo exterior.

Seria óbvio demais dizer que o equilíbrio entre razão e emoção produz adequada energia vital, porque a relação com o mundo exterior simplesmente não é assim...

Já foi visto que o predomínio da razão resulta em mais poder e nem sempre em mais energia vital. É nesta circunstância que residem os eternos ciclos de sucesso e fracasso típicos das conquistas as quais todos os seres humanos se lançam.

Na busca de reagir e atender às demandas da vida a tensão entre razão e emoção fazem variar, e muito, a energia vital de uma pessoa.

Desta maneira, o que temos é que o ser humano, de acordo com a razão, pode organizar um modo de vida perfeito, idealizar um par perfeito, mas ao relacionar-se com o mundo exterior vai estar sujeito, inexoravelmente, à tensão imprescindível à produção de energia vital determinante de seus sucessos e fracassos.

O predomínio emocional, por outro lado, é estagnação praticamente determinante do fracasso.

Nas relações interpessoais, teoricamente, emoções, razões e poderes individuais concorrem entre si criando parcerias ou dissensões.

Delicada é a questão de até quando, nestas relações interpessoais, o uso da razão pode ir, sem comprometer a energia vital de uma parceria, por exemplo.

Creio que seja aí que entre a honestidade enquanto fruto da percepção de que o poder sem sentido é nulo em si e quando este sentido for a reação a outro ser humano, há que se preservar a emoção, para nunca, jamais, sob pretexto algum, perder a energia vital em nome da própria razão.

Fácil de falar mas, dificílimo de viver !

Jussara Paschoini