terça-feira, 21 de dezembro de 2010

SER FELIZ É COZINHAR !




Razão, emoção e cultura...tudo isso junto e teremos o nobre ato de cozinhar que diga-se de passagem, não é para qualquer um.

A irreverência pode enfeitar diversas atitudes, mas quem cozinha de verdade, é um rebelde reverente, não à arrogância dos rótulos, mas algo muito mais sublime, essencial, indisfarçável , o paladar.

Quando o cozinheiro eleva-se ao teor da própria pretensão está a manifestar uma forma de amar muito genuína, presente nos seres humanos desde a partilha do leite materno, está provocando uma satisfação que jamais pode ser egoísta, realizando em si uma alegria que só pode ser alheia e necessariamente muito sincera.

Especial e exemplar a transcendência de quem efetivamente cozinha!

Refletindo sobre isso, vivencio os últimos dias desse ano, desejando que tenhamos paladar suficiente para reconhecer quem é reverente no mais simples da vida e cozinha de verdade, para que talvez, nos tornemos mesmo, menos sujeitos ao mero exibicionismo e muito mais saciados.

Feliz Natal e próspero Ano Novo!!!

Jussara Paschoini

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

OS ENGANOS




Sempre acaba acontecendo um instante na vida em que se observa o quanto mudamos e o quanto somos os mesmos e não rara é a surpresa com quantas e inúmeras vezes nos enganamos a respeito de quase tudo.

Nosso passado muitas vezes é bem mais do que um sapato velho, uma calça azul e desbotada que podemos usar do jeito que quisermos, ou, se é que alguém se lembra, bem mais do que o saudoso jingle da US - TOP.

No topo dos muitos fatos de nossa existência, sensações transitam em tempo distinto, por sua própria natureza instável, daí a sujeição inevitável ao engodo de nossa própria percepção.

Tanto a dor como o prazer apreendem a percepção dos fatos e geram ilusão, ou seja, quando o fato é tomado por uma sensação positiva ou negativa ele ganha outra esfera existencial, independente de sua correspondência com a realidade.

Esta natural ocorrência muitas vezes atribui às sensações a causa da inquietude humana e de suas mazelas, não sendo raro que a religião e a filosofia busquem abolir ou manipular, esta, por assim dizer, cegueira inerente à vida.

Iluminados se apregoam os seres que interagem libertos das sensações e, portanto, capazes de perceber a pura realidade sem equivocar-se.

A questão é se podemos viver livres de equívocos quando não nos lançamos ao sensacional daquilo que cremos ser a nossa mais alta ou baixa expressão em vida, ou melhor, do transitório ou permanente estado onde as coisas deixam de ser exatamente o que são.

Não há, salvo melhor juízo, como viver livre de equívocos, pelo menos na condição humana, porque há limites em nossa natureza e também no que podemos suportar.

Então, se o equívoco é inevitável, qual a diferença entre a esfera sensacional de percepção e a esfera real de percepção? Nenhuma, equívoco é equívoco.

A diferença está nos efeitos e a cada um cabe a dor ou a delícia de ser o que é ou não?



Jussara Paschoini

terça-feira, 16 de novembro de 2010

O IMUTÁVEL SECTARISMO



A Roma antiga foi um império iniciado graças a crenças religiosas muito antecedentes ao cristianismo e que foram suficientes a fixar direitos como os de propriedade e de família baseados na existência de uma vida pós-morte exatamente “em túmulo”, numa circunstância que obrigava os descendentes de um morto devidamente enterrado na sua nova vida “subterrânea”, à prática de rituais contínuos de sustentação material dos defuntos ascendentes (culto e oferendas aos antepassados), sob pena de criar terríveis demônios irados pelo desprezo e esquecimento.

As regras de culto consangüíneo aos mortos iniciaram o Direito Romano, fazendo de quem possuía a condição de cidadão romano, um protegido da lei e de quem não tinha tal condição, um sujeito à escravidão.

Assim, surgiu um império de uma crença que reuniu pessoas organizadas em regras impositivas, diferenciando-se das demais de acordo com tal e simples fato.

É de se observar que quanto mais rígido um conjunto de regras em uma sociedade, mais diferenciada ela tende a ser e mais fechada também.

A modernidade, no entanto, registra inúmeros movimentos sociais libertários, todavia, o modelo sectário persiste, o que significa dizer que embora as crenças tenham se diversificado, as ditas organizações continuam aprisionar indivíduos a comportamentos pré-determinados onde a liberdade continua a ter um mínimo espaço.

Lamentavelmente, o ser humano se compraz, assim como o cidadão romano, a ter um rótulo coletivo e a agir de acordo com ele, mesmo à custa de uma ilusão de ordem, onde se dispensa a gentileza, a consciência e a espontaneidade em troca de uma força capaz de manter uma crença.

Não importa se apontamos para muçulmanos, evangélicos, punks, hippies, yuppies, movimento dos sem televisão e internet, unidos do balacobaco na prisão de ventre, a Revolução dos Bichos de George Orwell, se revela a todo o momento!

Trocando em miúdos, não é a crença mas o poder que corrompe e como a união faz a força, alerta há de haver sempre que se enxergar “gente unida”.

A propaganda pode ser boa, mas para isso existe o Código de Defesa do Consumidor, e seria de bom tom acrescentar, dos Consumidos, para que se questione o preço justo da coisa toda.

É mister questionar se se quer ser submetido aos rituais de iniciação típicos da manutenção da ordem interessante ao todo e quem exatamente vai ganhar com isso?

O que perturba os ícones sociais é que a consciência não lhes poupa e a propaganda nunca lhes satisfaz, por isso, sempre será necessário combater os desiguais ou pelo menos enfraquecê-los ao ridículo de não corresponder ao modelo proposto.

Por conseguinte, o ser humano despojado, pacífico, harmônico, alegórico e sofisticado é um prisioneiro da própria insegurança, incapaz de se aceitar, dependente ao extremo de semelhantes apavorados a devorar um sentido para uma morte inevitavelmente solitária que os romanos, relembre-se, aproveitaram muito bem.

Jussara Paschoini

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Amor Eterno?



Qual seria o segredo de uma união conjugal eterna?

Deixando de lado todas as indagações acerca dos fatores que na modernidade permitem as pessoas não ficarem obrigatoriamente unidas pelo resto de suas vidas, assumindo as naturais mudanças de personalidade capazes de ocasionar a necessidade de relacionamentos novos, ambientes novos e, portanto, muitas vezes, a ruptura com relacionamentos antes constituídos em tais sentidos, o desejo de uma relação perene que assegure a constância da experiência de um convívio prazeroso, nunca deixará de existir nos homens e mulheres por menos iludidos que estes se declarem a respeito.

O fato é que dificilmente alguém desfruta do encantamento amoroso sem desejar manter em si a energia decorrente deste estado para o resto da vida, o encantamento qualifica a vida, transforma mágoas, impulsiona a mente, abre as portas do entendimento, enfim, muda tudo para melhor, pelo menos, geralmente e a princípio.

Neste ponto creio que surja o primeiro impasse porque toda energia, por mais forte que seja se esgota ou se consome na medida em que realiza sua finalidade, no caso do encantamento amoroso, a união com o ser objeto de encanto...

Energia resultante em união e união resultante em convívio.

Partindo do pressuposto que a energia do encantamento atingiu sua finalidade e uniu pessoas ao convívio, é neste, no convívio, que podemos encontrar ou não a constância capaz de realizar uma perene união conjugal.

A regra norteadora dos relacionamentos mais tradicionais sempre foi a natural dependência oriunda dos laços familiares... hoje isso não é mais suficiente. Pode até manter relações convenientes, mas não é mesmo mais suficiente e nem realiza a pretensão do amor perene.

A maioria das pessoas atribui o desgaste de convívio à rotina, qual seja, a contínua repetição de ações conjuntas ou não que acabariam por perder a graça, tornando a vida monótona e sem sentido.

Se por um lado a rotina faz a vida monótona, não se pode ignorar que a rotina é inerente à vida de qualquer ser humano, ou seja, antes de partirmos para uma bastante possível vida espiritual, livres do corpo, teremos de dormir, acordar, comer, ter hábitos higiênicos, realizar necessidades fisiológicas, trabalhar, administrar ganhos e perdas, tudo isso em vinte e quatro horas diárias, sete dias semanais, trinta dias mensais e trezentos e sessenta e cinco dias anuais.

Não há fórmula mágica que modifique o fato de que uma vida saudável e valorizada depende muito da rotina e da capacidade que temos de formulá-la de acordo com o que entendemos importante.

Mesmo uma pessoa que queira ter uma vida noturna intensa, com festas e badalações, por exemplo, precisa de uma rotina, querendo dizer que independentemente do gosto e do critério, para tudo é necessário certa ordem, uma margem fixa onde meios são seqüencialmente dispostos para garantir a consecução de uma vontade.

A rotina minimiza os riscos de que a vontade daqueles a que serve seja frustrada.

Agora encontramos o que acredito ser um ponto divergente e importante na análise do convívio, a vontade, porque é de se perceber que em sendo a rotina um fruto necessário da vontade, é nela que poderá se encontrar a verdadeira fonte do desgaste nos relacionamentos.

Daí é preciso notar que um indivíduo que não sabe o que quer e não tem vontade definida não está apto para o convívio por desconhecer o que lhe satisfaça e portanto não poder se beneficiar de nenhuma rotina, muito menos partilhá-la com outra pessoa.

O paradoxo da vontade versus rotina é complicado de se observar porque a útil ordenação repetida de atos e acontecimentos, também pode acomodar a vontade e sem ela a satisfação é impossível.

Todavia, não é a rotina o problema a ser tratado como fonte de insatisfação mas a vontade que a precede, porque a rotina deve servir a vontade e não o contrário.

O dilema é que o foco das atenções é dado à rotina e tentam-se exuberâncias, malabarismos, fórmulas publicitárias, aventuras etc. e não se procura conhecer a própria vontade, numa circunstância que anula qualquer esforço.

Conhecer a própria vontade num mundo com tantos determinantes do que é bom ou ruim, do que é sucesso ou fracasso, onde a ilusão é imperial, pode parecer uma ambição sem nexo, mas é simples, basta enxergar o que é, partindo de um básico cafezinho no bar mais próximo, por exemplo.

Nós somos também nossa vontade, basta que estejamos atentos a ela, não importa o que estejamos fazendo, podemos perceber a nossa vontade e uma vez percebendo, podemos articular os meios e as rotinas para realizá-la.

Conhecida a vontade restam os indivíduos seus titulares e não a rotina como fonte de divergência e desgaste no convívio.

Vontades diferentes postergam rotinas insatisfatórias a ambas as partes de um convívio.

No entanto, se o convívio for um verdadeiro fruto de ambas as vontades, certa partilha de satisfação haverá de ser alcançada por vontades comuns e eis a semente da planta principal , a árvore central desse jardim.

Entre dois indivíduos diferentes é impossível identidade completa em qualquer sentido, mas a energia do encantamento amoroso produz ânimo de vontade comum e este ânimo é o que precisa ser preservado pelo constante diálogo com a tomada de decisões conjuntas.

Decidir conjuntamente é uma tarefa litigiosa para pessoas que não aceitam a própria individualidade e necessitam muito de referenciais porque estando falhas consigo mesmas não consideram o conjunto mas a própria necessidade de ser, subjugando ou sendo subjugado.

Quando o indivíduo quer chamar atenção para si mesmo jamais terá a capacidade de ser partícipe de uma decisão conjunta o que faz minguar o ânimo da vontade comum essencial ao convívio verdadeiro.

Isto quer significar que a preservação do ânimo da vontade comum só existe quando o grau de individualidade das pessoas que convivem for suficientemente equilibrado pelo exercício das vontades independentes de cada um.

É essencial do convívio a vontade individual e a vontade comum, sendo que esta última tem origem no diálogo.

Assim o diálogo serve a vontade comum e visa decisões satisfatórias imprescindíveis ao convívio. A relação já existe!!!

A vontade individual por ser do conhecimento de seu portador dependerá de seus próprios meios e condições de satisfação, realizando-se na margem de acontecimentos não vinculados pelo ânimo da vontade comum.

Ponderável é que a vontade comum exista em proporção compatível ao convívio de indivíduos livres porém dedicados a partilhar satisfações conjuntas por mútua decisão.

Entendida a importância da vontade e sua comunhão por vias do diálogo e da dedicação, é necessário entender este outro ingrediente, a dedicação.

Imaginemos uma pessoa que coleciona selos, uma criança que coleciona figurinhas, um torcedor de time de futebol, todas estas condições requerem dedicação e têm certo grau de dificuldade, mas, nem por isso deixam de se constituir, com freqüência, como fruto de uma forte e persistente vontade, bastante resistente aos percalços e contrariedades decorrentes.

A diferença entre a dedicação abordada nos exemplos acima e a dedicação de um casal à vontade comum é, por exemplo, que o torcedor de futebol não tem que almoçar com o capitão de seu time no dia da derrota e nem divide o prêmio da vitória, quando esta ocorre.

Todavia, dedicação é dedicação e os torcedores são fiéis.

Então a dedicação menos próxima é mais fácil de manter porque as contrariedades individuais são livres e não se confrontam, há um tempo para extremos e há um tempo para tentar de novo que permite ao indivíduo retomar a vontade de torcer, colecionar selos ou figurinhas.


Isto leva a concluir que a vontade comum é uma conquista conjunta e a chave para manter a dedicação a esta vontade é saber dar tempo às vontades individuais em duas circunstâncias, a primeira quando houver um justo impeditivo para se decidir sobre a vontade comum e a segunda quando a satisfação da vontade comum deixar de acontecer.

O justo impeditivo é aquele que existe apesar da dedicação que um dos conviveres gostaria de dar a uma decisão fruto da vontade comum, sendo importante, neste caso, que se reconheça o impeditivo e a impossibilidade de se lidar com ele para que se saiba esperar a hora do jogo, a chegada do selo ou da troca de figurinhas.

A notícia cabe a quem estiver impedido.

Estar diante do justo impeditivo não é estar diante da falta de dedicação à vontade comum quando esta ainda existir e puder ser, portanto, preservada no convívio, pelo saber dar tempo às vontades individuais.

Depois da decisão fruto da vontade comum vem a segunda hipótese em que dar tempo às vontades individuais é necessário, ou seja, quando em decorrência do decidido um dos dois ou ambos não ficarem satisfeitos.

A vontade era comum a decisão pareceu certa, mas, o resultado não foi alcançado de maneira a deixar ambos satisfeitos (o time perdeu). Esse é o momento de dar tempo às vontades individuais até que a vontade comum retorne naturalmente.

O tempo e o silêncio são os melhores mediadores harmônicos e conscientes que um casal dedicado à vontade comum pode ter contra qualquer espécie de frustração.

Questão surge quanto a como saber o tempo da vontade individual que não nos pertence. Não se sabe...apenas se espera porque isto é certo e porque a vontade comum volta naturalmente tão logo seja anunciado o próximo jogo, a disponibilidade de um novo selo ou a figurinha que faltava.

Para quem já alcançou sua consciência pessoal, esses são os componentes imprescindíveis a fazer a vontade das pessoas que convivem progredir conjuntamente rumo a uma rotina favorável e não desgastante e quem sabe alcançar o tão idealizado e pouco vivido amor perene.

Jussara Paschoini

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Reflexões sobre diferenças e igualdades





Diferenças e igualdades...


No que somos iguais? Todos dependemos de ar, água, comida e por que não dizer higiene e abrigo físico acerca das variáveis climáticas naturais que podem nos prejudicar.

Satisfeitas essas necessidades que nos igualam, sobreviveremos, caso contrário mais cedo ou mais tarde sucumbiremos pela fragilidade que nos é inerente e comum.

Boa parte das nossas vidas é dedicada à sobrevivência, na obtenção de meios e resultados para a satisfação do que nos iguala.

A grande e primeira diferença surge quando menos esforço e dedicação precisa ser feito para a sobrevivência, uma circunstância que resulta em que alguns tenham que se dedicar mais e outros menos na satisfação das necessidades igualitárias.

Assim, somos iguais em necessidades e diferentes na maneira de satisfazê-las.

Um homem ou uma mulher não precisam se reproduzir para sobreviver, não há relatos de que castidade mate...todavia, o segredo que sempre fez ocultar a genitália humana desde “Adão e Eva”, não permite responder se os sobreviventes castos não tinham impulso e portanto necessidade reprodutiva...

Admitamos, por conseguinte, que há uma necessidade fisiológica sexual naturalmente vinculada à capacidade reprodutiva em homens e mulheres, com a ressalva de que a satisfação de tal necessidade é o prazer que provoca e não necessariamente o resultado reprodutivo.

Eis uma fonte de satisfação que não ameaça a sobrevivência caso o resultado obtido pelos meios humanamente empregados, não seja absolutamente nenhum, pelo menos fisicamente.

Provavelmente é daí que se origina a noção científica de que o comportamento humano seja em muito determinado pelo instinto reprodutivo, porque se traduz em uma necessidade fisiológica não atendente da sobrevivência de seu portador, mas capaz de sojigar os seus sentidos e percepções, afetando indiretamente sua capacidade de sobreviver, mesmo.

Assim, por melhores que sejam os meios de obtenção de satisfação das necessidades, a contrariedade do instinto reprodutivo, quanto maior for a intensidade deste, mais afetará o comportamento do indivíduo naturalmente afetado que ansiará por sua satisfação relegando, muitas vezes, o básico da própria vida.

É lamentável observar, por esta ótica, que se fossemos castrados antes de ser impingidos por relevante impulso reprodutivo, nosso comportamento seria drasticamente modificado...

Focalizado o impulso sexual para posterior abordagem, é importante retornar a satisfação de necessidades humanas que nos igualam, observando as diferenças biológicas ou não, quanto a modo e intensidade de respectiva satisfação.

Há uma medida para satisfação de cada necessidade igualitária, tanto a falta quanto o excesso são mortais, todavia, entre um extremo e outro, individualidades vão se destacando quer por meios quer por resultados satisfativos.

A cultura vai valorar os meios e os resultados e os iguais em necessidade vão se diferenciar conforme se aproximem ou se distanciem desses valores, tornando-se indivíduos mais ou menos satisfeitos.

Apartado, contudo, o indivíduo da escala de valores culturais, os meios e resultados por ele exercidos e obtidos, enquanto variáveis, podem ou não fixar uma maneira de conduzir suas atitudes rumo à satisfação.

Sem nos atermos a moral da conduta individual na satisfação das necessidades igualitárias e sua diversidade, é possível deduzir o aperfeiçoamento desta segundo um maior controle de meios e sucesso de resultados ou segundo um mais adequado controle das próprias necessidades, a estabelecer o grau de independência do indivíduo e a sua maior liberdade fora do âmbito da sobrevivência.

Quanto maior for a independência maior será a possibilidade de aperfeiçoar a conduta individual rumo ao científico "latu sensu"  com prováveis influências a longo e médio prazo na cultura e valores dela decorrentes.

Necessidades iguais, condutas diferentes, independência relativa.

É possível retornar ao influentíssimo instinto reprodutivo, partindo de que homens e mulheres são iguais em necessidades, diferentes em conduta e relativamente independentes, podendo ambos sofrer as influências subversivas de suas individualidades, pautados pelo impulso sexual.

Encarando esta incômoda porém prazerosa necessidade, há que se ponderar, à princípio, seu grau ilimitado de independência no indivíduo, na medida em que tanto os meios quanto os resultados têm um significado gradual muito menos determinável em termos de satisfação do que quando se trata das necessidades comuns.

O grau ilimitado de independência pode funcionar em termos do impulso sexual, tanto ativa quanto passivamente, estabelecendo possíveis condutas de seus portadores na utilização de vários meios com vistas a satisfação.

Comum a influência dos impulsos sexuais e o seu caráter independente, cumpre seguir além da satisfação ao resultado reprodutivo ou não, desejado ou não.

A reprodução implica no nascimento de outra e nova pessoa e conseqüente aumento das necessidades a se satisfazer sob pena de morte, implica, portanto, no implemento de meios e resultados, além de redução da possibilidade de independência individual.

Logo, junto com o prazer que acena, o impulso sexual é potencial limitante do aperfeiçoamento de conduta e da liberdade individual, por fazer preponderar o aumento de necessidades a se satisfazer.

Sem estigma moral, o resultado reprodutivo é o que diferencia o impulso sexual masculino do feminino, porque o homem não é naturalmente vinculado a esse resultado e o mesmo não ocorre com a mulher que igual em necessidades, sofrerá o significativo aumento destas, tornado-se muito mais dependente em termos de satisfação.

O possível resultado e o conhecimento a respeito deste, para a mulher é condicionante de conduta e indubitavelmente limitante do impulso quase que desde sua aparição, pois naturalmente se pressente a redução dos horizontes de sua individualidade em prol do aumento das necessidades decorrentes da reprodução.

Nesta conjuntura advém obviamente a preponderância ativa da conduta masculina e passiva da conduta feminina, ambas, porém, não deixam de articular meios com vistas a satisfação de resultados.

A cultura ainda determina que para a mulher o impulso sexual seja legítimo quando acoplado a finalidade reprodutiva e a instituição familiar, portanto o homem com conduta aperfeiçoada para melhor satisfação de necessidades materiais é o homem que melhores resultados obtém em termos de satisfação sexual dependente do sexo oposto. Atente-se a que a reciprocidade é inverossímil.

Apartada a finalidade reprodutiva, o impulso sexual feminino ainda permanecerá como que invadido pela potencial e mais grave perda da individualidade, o que, fará perdurar em muito a passividade típica das condutas femininas, a qual, nem por isso, será pouco variável ou sujeita a inovações de meio, resultado e aperfeiçoamento.

Ativa ou passiva, as diferentes condutas dos iguais em necessidades, demanda apenas a humildade de se reconhecer como humano e a nobreza de amar o seu semelhante, acima do critério da satisfação e adiante de resultados mais conscientes, que apesar de tudo e paradoxalmente permanecem incertos para indivíduos que pagam caro o preço da sobrevivência e da evolução.


Jussara Paschoini

segunda-feira, 13 de setembro de 2010








PRECONCEITO


Ninguém fala positivamente de preconceito, quando se invoca a palavra maldita, logo pensamos nas minorias, rotuladas e sofredoras pela falta de oportunidade de mudança e crescimento diante de um olhar social dificultoso e definitivo.

Do ponto de vista meramente semântico o preconceito é apenas o que precede o conceito, ou seja, uma idéia com origem em impressões parciais que precede a formação de um juízo mais completo, de valor ou não, a respeito de um objeto ou pessoa.

Todavia, deixando de lado o estigma social, tão amplamente utilizado na abordagem sempre negativa do preconceito, do meu ponto de vista, é muito hipócrita aquele que se afirma destituído de preconceito.

Ninguém inicia o conhecimento a respeito de nada sem impressões, sem observações, sem dados históricos precedentemente memorizados em pensamentos e sensações, o preconceito puro, é o início para qualquer relação fundada nos instrumentais humanos de relacionamento, a razão e a emoção.

Creio então que aí seja possível divisar o preconceito de origem coletiva do preconceito individual, ou seja, o que vem plantado há gerações na história, do que vem fundado na experiência individual.

Vejo que cada indivíduo exerce sua dose de preconcepções pessoais e distintas, temos simpatias e antipatias, que são preconceitos potencialmente individuais, derivados do contato com imagens, sensações e percepções causadoras de repúdio ou atração...

O nível do repúdio causado por um preconceito individual determina a manutenção ou não de contato com objeto repudiado...se o repúdio for muito grande, o preconceito é insuperável, a relação com objeto, se acontecer, será fruto de muito desprazer e até agonia...

Então vem a questão, até que ponto o repúdio oriundo de um preconceito individual é censurável? A liberdade de ter um preconceito com relação a um objeto é sempre contrária a algum direito?

Impor a alguém que haja sob acentuado grau de repúdio sob a égide de eliminar o preconceito é justo? Nem todo mundo gosta de lesma...eu mesmo tenho um nojo irreparável...iguaria para alguns, para mim é um preconceito a ser mantido sob pena do vexame de regurgitar na mesa de jantar.

Então, quando não se quer comer lesmas, não se come lesmas não só pelo preconceito mas para evitar um dano a quem quer a liberdade de comer a iguaria temperadinha com manteiga e alho, sem a presença de vômito.

Assim, o jovem que preconcebe, sem sequer experimentar, baseado em que o cigarro ou a bebida alcoólica, fazem mal à saúde , acaba por ser destituído do status de fumante, do status de tomador de todas, e permanece no grupo dos preconceituosos “caretas”, mas será?


Tocando, entretanto, na ferida nossa de cada dia, o pior é quando desgostamos preliminarmente de alguém que é querido por outros, os quais muitas vezes são queridos por nós...isso não nos dá direito a nada, nos toma a liberdade de estar com quem gostamos, não porque vamos regurgitar na mesa, mas porque podemos reagir tão estranhamente quanto...

Trata-se de um preconceito individual agravado progressivamente porque causa desgosto, subtrai e é praticamente irremediável...vença o preconceito...coma a lesminha com coragem e fé, tanta gente gosta!

É difícil admitir, mas sei que preconceito se tem também em um teor singular de idéias e sensações muito próprios de cada um, e com todo respeito aos conceitos que poderiam se formar, algumas vezes, por questão de bom senso, se prefere viver sem os possíveis mas intangíveis conceitos. A experiência devidamente sopesada delata ser melhor não formá-los ou inútil persegui-los.

Convivamos então, inteligentemente, com as idéias e relações que deixaram de germinar, e saibamos, do mesmo modo, persistir naquelas que valem a pena, mesmo quando tudo ou apenas algo insignificante depõe ao contrário.


Jussara Paschoini

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Ética na perícia médica











Segundo a mais corrente visão dos Conselhos Profissionais Médicos voltados ao resguardo ético da medicina: “A perícia médica é atividade legal responsável pela produção de prova técnica em procedimentos administrativos ou em processos judiciais.”

Nesta definição usual se encontra a primeira e mais importante vinculação ética da perícia, qual seja, a produção responsável de prova no contexto de procedimentos administrativos e ou judiciais.

Nesta dicotomia, é importante observar como administrativo o contexto da perícia médica vinculada aos serviços públicos de oferta obrigatória do Estado, mormente os voltados para a satisfação de direitos trabalhistas e previdenciários, no âmbito da averiguação, constatação, definição e mensuração de efeitos de doenças e deformidades para regular oferta de benefícios e compensações garantidas pela lei em proporção ao grau de incapacitação dos cidadãos respectivamente envolvidos.

A perícia médica vinculada a atos judiciais é conseqüência de litígio, ou seja, difere da meramente administrativa por servir a interesses contrapostos entre partes sujeitas ao arbítrio jurisdicional.

Diante deste fato, imprescindível notar, antes de submeter à análise ética específica, que o expediente pericial médico se trata de um ato direta ou indiretamente sujeito às regras públicas de administração, aos princípios de legalidade, razoabilidade, moralidade, supremacia do interesse público ou do bem-comum em uma sociedade politicamente organizada.

Ponderando a abordagem sobre parecer pericial de Hely Lopes Meireles, segundo o qual: “No parecer ou julgamento não prevalece a hierarquia administrativa, pois não há subordinação no campo da técnica.”, eis que o contexto ético da perícia no âmbito administrativo e ou judicial não poderá deixar de se sujeitar à regência dos atos públicos para que o expediente pericial seja revestido de probidade.

O perito médico por essência é um agente público, ainda que temporariamente investido nesta condição, de maneira à, precipuamente, sujeitar-se aos já mencionados princípios cuja definição, em suma, se apresentará a seguir.

O princípio da legalidade diz respeito a vinculação do ato à lei, tanto para efetivação do direito como para respeito à liberdade do cidadão.

O princípio da razoabilidade se refere à utilização de meios adequados à obtenção dos melhores resultados na finalidade do ato.

O princípio da supremacia do interesse público ou do bem-comum, em uma sociedade politicamente organizada, concerne ao caráter impessoal do ato, no sentido de que se busque efetivar o bom e o justo acima de qualquer outro interesse desvinculado.

O princípio da moralidade é aquele mais ligado aos aspectos éticos do ato administrativo, à conduta do agente ou perito, constituindo fundamento de correlata responsabilidade, a qual, conforme já se viu, na perícia médica, aplica-se à regular produção de prova, bem como à validação da mesma no mundo jurídico.

Assim, a perícia médica se traduz em um ato administrativo em que a moralidade é preponderante da responsabilidade do perito, daí advindo a necessidade de se estabelecer norteadores éticos desta conduta para realização de todos os outros princípios já explicitados.

Partindo do óbvio de que o perito médico é legalmente inscrito como tal em um Conselho Regional representativo da categoria, é no Código de Ética Médica que se encontram os fundamentos éticos principais da conduta em comento.

O Capítulo XI do Código de Ética Médica, em seu típico sistema de vedações, estabelece:

“É vedado ao médico:

Art. 92. Assinar laudos periciais, auditoriais ou de verificação médico-legal, quando não tenha realizado pessoalmente o exame.

Art. 93. Ser perito ou auditor do próprio paciente, de pessoa de sua família ou de qualquer outra com a qual tenha relações capazes de influir em seu trabalho ou de empresa em que atue ou tenha atuado.

Art. 94. Intervir, quando em função de auditor, assistente técnico ou perito, nos atos profissionais de outro médico, ou fazer qualquer apreciação em presença do examinado, reservando suas observações para o relatório.

Art. 95. Realizar exames médico-periciais de corpo de delito em seres humanos no interior de prédios ou de dependências de delegacias de polícia, unidades militares, casas de detenção e presídios.

Art. 96. Receber remuneração ou gratificação por valores vinculados à glosa ou ao sucesso da causa, quando na função de perito ou de auditor.

Art. 97. Autorizar, vetar, bem como modificar, quando na função de auditor ou de perito, procedimentos propedêuticos ou terapêuticos instituídos, salvo, no último caso, em situações de urgência, emergência ou iminente perigo de morte do paciente, comunicando, por escrito, o fato ao médico assistente.

Art. 98. Deixar de atuar com absoluta isenção quando designado para servir como perito ou como auditor, bem como ultrapassar os limites de suas atribuições e de sua competência.
Parágrafo único. O médico tem direito a justa remuneração pela realização do exame pericial.

Depreende-se do conteúdo ético-normativo que a perícia deva se restringir à técnica, no caso sob análise, aos argumentos científicos próprios da medicina para realizar a finalidade competente, qual seja, a produção de prova documentada em relatório acerca de um evento ou condição plausível de constatação e análise médica.

Qualquer outra disposição pericial que não a técnica apropriada, compromete a isenção ética assinalada pelo preponderante artigo regente da atuação ética na perícia.

Outra percepção ética diz respeito ao conteúdo autoral ideológico do relatório ou laudo produzido em perícia, vinculando o perito ao documento produzido mediante sua participação pessoal para a conseqüente assinatura. Deve haver identidade entre laudo e perito.

Também figura como importante a disposição derivada daquela comentada inicialmente ao especificar a impossibilidade de intervenção de vínculos pessoais quaisquer com pessoas envolvidas no expediente pericial e que possam mesmo que hipoteticamente caracterizar influência no trabalho a ser realizado.

A intervenção do perito em procedimentos propedêuticos recebe limitação aos casos de iminente perigo de morte.

Merece registro por fim , a disposição ética que assinala o caráter documental escrito da prova a ser produzida em perícia, restringindo as manifestações orais acerca dos pareceres conseqüentes dos exames técnicos realizados, à presença do examinado.

O mesmo artigo menciona ainda a intervenção nos atos de outro profissional também como uma limitação do perito, mais propriamente no sentido de reservar e limitar o objeto de análise ao relatório ou laudo, mediante conteúdo tecnicamente fundamentado e isento.

Vistos os princípios fundamentais dos atos administrativos ou judiciais aos quais a perícia estará normalmente vinculada para a produção de uma prova técnica e documental conforme indicadores éticos da categoria médica principalmente para efeitos da moralidade imponente, cumpre registrar que a prática desenvolveu outras normas com vistas ao resguardo de tais preceitos básicos.

O Conselho Federal de Medicina em Resolução 1.497 de 08 de julho de 1.998, considera que os Conselhos Regionais de Medicina têm a incumbência de fiscalizar os atos profissionais do médico designado como perito, este investido da condição de agente público responsável, civil, penal e administrativamente e normatiza :

Art. 1º - Determinar que o médico nomeado perito, execute e cumpra o encargo no prazo que lhe for determinado, mantendo-se sempre atento às suas responsabilidades ética, administrativa, penal e civil.

Art. 2º - O médico designado perito pode, todavia, nos termos do artigo 424 do Código de processo Civil, escusar-se do cargo alegando motivo legítimo.

Art. 3º - O descumprimento da presente Resolução configura infração ética, sujeita a ação disciplinar pelos respectivos Conselhos Regionais de Medicina.

Os Conselhos Regionais de Medicina muitas vezes estabelecem normas específicas no que concerne as perícias médicas para especificar e deixar claro condutas que podem ferir o necessário respeito à ética profissional conducente a regularidade da perícia.

Exemplificativamente é possível citar os Conselhos Regionais de Medicina da Bahia e de São Paulo, Resoluções 288/07 e 126/05 alterada pela 167/07 , de modo respectivo.

De um modo geral as resoluções reformulam vedações relativas à suspeição do perito e o dever de esquivar-se do encargo sempre que caracterizados impeditivos da espécie, fazendo-o de forma escrita e justificada.

Além disso, as resoluções costumam incluir vedações tangentes aos assistentes técnicos, embora estes não sejam propriamente investidos na condição de agentes públicos, quando houver vínculo de trabalho ou de qualquer outro interesse com relação a empresas envolvidas em expediente pericial.

São também comumente observadas as necessidades respeito aos prazos assinalados para a realização da perícia, o dever de sigilo, o respeito a autonomia profissional do ato médico analisado livre de intervenções modificativas junto ao examinado, ressalvada a iminência de risco de morte ou perda de função deste.

As resoluções assinalam ainda a necessidade de preservação da intimidade do examinado, o direito a obtenção e disponibilidade recíproca de documentos e informações sobre o quanto estiver sob análise pericial, a preponderância da autonomia científica do perito que poderá esquivar-se por escrito sempre que submetido a qualquer constrangimento, coação ou pressão capaz de influir na imparcialidade técnica necessária.

Resumindo, são vários os indicativos regionais acerca de especificidades regentes do que pode ser considerado uma conduta ética na perícia, todavia as variáveis convergem ao fundamental princípio da moralidade regente de todo e qualquer ato público, no caso àquele destinado a produção de prova consoante o já explicitado.


JUSSARA PASCHOINI

segunda-feira, 29 de março de 2010

O quarto poder ou o moderno Coliseu?














Há muitos anos venho indignada com o modo que a mídia pode produzir efeitos jurídicos.

É óbvio que a morosidade processual, enquanto problema crônico da solução de litígios de qualquer área, civil ou criminal, oferece como fruto o descontentamento popular, todavia, um erro não justifica o outro muito maior, que é o de atribuir às emissoras de televisão e congêneres, um poder público absoluto, capaz de decidir e condenar qualquer cidadão em cinco minutos de exposição.

Não se trata, portanto, de avaliar particularmente e humanamente o mérito de tragédias demandantes de solução judicial, mas de conter por absoluto comprometimento dos atos de justiça, a influência dos que recebem muitos, mais MUITOS MILHÕES à custa do sofrimento e do sangue alheio, numa autêntica reprodução moderna do antigo Coliseu de Roma.

Dentre o povo que se submete cegamente a esse tipo de poder, não podemos esquecer, estão os serventuários da Justiça, pessoas obrigadas ao critério fundamental de isenção e impessoalidade ao qual se sujeitam todos os atos públicos!

Quando se admite irrestritamente o comprometimento desta isenção em troca de milhões em audiência, uma corrupção implacável se instaura, sendo certo que o Coliseu que se reproduz, demonstra que se o direito evoluiu aos humanos, os humanos não evoluíram ao direito e continuam a sentir prazer com a desgraça alheia, sem se aperceber que um dia, talvez, eles mesmos sejam levados a esta arena insana e irresponsável, sem que nenhum direito possa lhes acudir.

É “Alea jacta est”, famosa frase de Júlio César, literalmente correspondente a “A sorte está lançada”, cujo significado histórico serve a fatores determinantes de um resultado já realizado.

Júlio Cesar desprezava o Senado, lançava-se aos crimes de guerra e desafiava a lei buscando obter para si uma imunidade que não merecia, mas tinha. Viva a Rede Globo de Televisão, o repórter Pimenta das Neves etc.!

Não quero aqui, presentear nenhum bandido com imunidade, mas gostaria de registrar como cidadã e profissional do direito, o meu repúdio ao quarto poder instaurado num pseudo Golpe de Estado legitimado pela inconsciência popular, onde alguns são crucificados e outros não, enquanto este usurpador enriquece calmamente e sem nenhum dever de retribuição, nem mesmo ética, aos súditos.

Jussara Paschoini

quarta-feira, 10 de março de 2010

Razão, emoção e honestidade para todas as relações








Vivemos em um mundo que privilegia as criações da razão e seus efeitos e que sofre com a carência emocional.

A razão e a emoção sempre foram tratadas de forma antagônica, são rivais desde os tempos ancestrais na interpretação dos fatos e na tradução das tragédias.

Considerando, contudo, que tanto a razão quanto a emoção são portadas pelo ser humano, homem ou mulher, cumpre definir o que é um e o que é outro e eis a questão...

A razão é o diferencial humano instrumentalizado pelo pensamento com a finalidade de atender as mais variadas demandas da vida.

A emoção é também o diferencial humano instrumentalizado pelo sentimento como forma de reagir as mais variadas demandas da vida.

Não seria ousado dizer que a razão é ação e a emoção é reação, em uma se detém o poder e em outra não.

Não é difícil entender o porquê da oposição entre razão e emoção... são mesmo bem distintas em essência.

Nesta linha de pensamento é possível estabelecer que o poder esteja na razão e se a emoção é o seu oposto, nela impera a ausência de poder, o vazio, o inexplicável, todos prontos para reagir ao que quer que seja.

Enquanto uma age a outra reage, a ordem dos fatores não modifica tal fato.

Prosseguindo, o que se pode deduzir deste antagonismo natural é que aqueles sob o domínio da razão têm sempre mais poder e aqueles sob o domínio da emoção não... Será?

Será, não, é, o poder é matematicamente vinculado à razão, portanto quando o critério for poder, nem há que se falar em antagonismo, a razão é, por essência, vitoriosa.

Ocorre que, o poder só se presta aos objetos e fatos aos quais se relaciona, sem mundo exterior, o poder é infrutífero e sem sentido e é aí, no mundo exterior, que a emoção arrebata a cena, porque é nela, que a reação pode acontecer...ou não...

Num silogismo mais ou menos perfeito a razão tem um poder absoluto que é nulo em si sem o sentido que vem da emoção.

Há pois um antagonismo de interdependência inquestionável entre razão e emoção, uma tensão necessária entre dois pólos opostos para produção daquilo que creio poder chamar de energia vital.

Religião à parte, creio ser isto o que Jesus queria mostrar quando disse que “nem só de pão vive o homem”.

Fixado que a tensão entre razão e emoção é a fonte de energia vital do ser humano, é de se notar que a intensidade desta tensão não produz mais ou menos energia vital, trata-se de uma tensão necessária mas indeterminada em si, na medida em que depende do mundo exterior pelo componente emocional.

Assim, o ser humano tem razão e emoção tensas entre si, produzindo energia vital conforme relação com o mundo exterior.

Seria óbvio demais dizer que o equilíbrio entre razão e emoção produz adequada energia vital, porque a relação com o mundo exterior simplesmente não é assim...

Já foi visto que o predomínio da razão resulta em mais poder e nem sempre em mais energia vital. É nesta circunstância que residem os eternos ciclos de sucesso e fracasso típicos das conquistas as quais todos os seres humanos se lançam.

Na busca de reagir e atender às demandas da vida a tensão entre razão e emoção fazem variar, e muito, a energia vital de uma pessoa.

Desta maneira, o que temos é que o ser humano, de acordo com a razão, pode organizar um modo de vida perfeito, idealizar um par perfeito, mas ao relacionar-se com o mundo exterior vai estar sujeito, inexoravelmente, à tensão imprescindível à produção de energia vital determinante de seus sucessos e fracassos.

O predomínio emocional, por outro lado, é estagnação praticamente determinante do fracasso.

Nas relações interpessoais, teoricamente, emoções, razões e poderes individuais concorrem entre si criando parcerias ou dissensões.

Delicada é a questão de até quando, nestas relações interpessoais, o uso da razão pode ir, sem comprometer a energia vital de uma parceria, por exemplo.

Creio que seja aí que entre a honestidade enquanto fruto da percepção de que o poder sem sentido é nulo em si e quando este sentido for a reação a outro ser humano, há que se preservar a emoção, para nunca, jamais, sob pretexto algum, perder a energia vital em nome da própria razão.

Fácil de falar mas, dificílimo de viver !

Jussara Paschoini