segunda-feira, 13 de maio de 2013

HABILIDADE PARA ÁGUAS TURBULENTAS E ATENÇÃO AO NAVEGAR CONTRA A MARÉ NA MEDIDA PROVISÓRIA 595/12


 
É intrigante que com tamanha costa marítima e com tantas vias fluviais e mais com a ascendência colonizadora portuguesa, só agora, depois de tantos anos de transtorno rodoviário movido a diesel e a estimulantes de portentosos acidentes variados, além de pretensões ferroviárias mal acabadas, vinte e tantos anos de democracia, venha a atualidade alardear a retomada da paixão lusa pela navegação como interessante e necessária ao comércio e indústria nacional. Enfim, a cabotagem.

Pensando superficialmente no assunto, já que nesse ponto não recebemos ao que tudo consta, uma influência de perspectivas da arte portuguesa cujo contato parece haver se resumido em vir e ir de posse do que lhe interessava com as grandes frotas navais consuetudinárias da pátria mãe, o uso da cabotagem acena com uma alternativa alvissareira de transporte de grandes cargas, num período de tempo que de bom pode ser aperfeiçoado, inclusive pela harmonização de entraves burocráticos e intervenções funcionais de ordem tecnológica e estrutural, principalmente.

Por outro lado, a desenvoltura da estrutura portuária em si, já traduz não só a abertura ao tráfego de interesses mútuos com o exterior, como também é fonte de renda na oferta de inúmeros serviços circundantes da atividade.  

Deve ser um negócio da CHINA! E com a oportuna analogia africana, os ânimos dos cinco grandes, o que inclui paquidermes, está muito exaltado de uma parte e, muito “na moita”, de outra, para falar o português claro.  

O poder executivo quer as rédeas administrativas da atração e direção de capital para implementar as medidas de organização na implantação de portos, notadamente ao longo de toda a vasta costa nacional e o poder legislativo quer a descentralização desse poder, ao mesmo tempo em que se engaja na preservação da estrutura já existente, tanto pela manutenção de servidores públicos na atividade portuária quanto pela protelação de contratos cuja vigência está próxima de caducar.  É o velho, eterno, direito adquirido brasileiro.

A caducidade dos prazos concedidos para exploração dos portos e transporte aquaviário ameaça grandes interesses e a postura descaradamente protelatória de parlamentares ao achincalhar e regozijar em torno de confusões sempre plausíveis pela mais absoluta falta de credibilidade dos eleitos por vias escusas até hoje escusáveis, depõe no sentido de que não é do povo, pelo povo e nem para o povo que o renascimento náutico panfleta próximo das entrâncias do processo eleitoral.

É importante pontuar, contudo, o seguinte: De acordo com artigo 21, inciso XII da Constituição Federal, é competência da União, ou seja, do governo federal, explorar diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços ferroviário, aquaviário entre portos brasileiros e fronteiras nacionais, ou que transponham os limites do Estado ou Território, bem como, os portos marítimos, fluviais e lacustres.

De outra feita, o artigo 178 da Constituição estabelece que a ordenação dos transportes aéreo, aquático e terrestre deverá ser disposta em lei, quanto a ordenação do transporte internacional devendo observar os acordos firmados pela União, atendido o princípio da reciprocidade; além de especificar acerca do transporte aquático, a necessidade de se estabelecer as condições em que o transporte por embarcações estrangeiras poderá ser feito na cabotagem e navegação interior do país.

O artigo 175 da Constituição Federal condiciona à lei e à licitação toda a prestação de serviços públicos, portanto a autorização, concessão e permissão de que trata o artigo 21 retro mencionado, e que, aliás, também se aplica aos serviços de telecomunicação, conclui a regência máxima do assunto em comento.

A União é titular da matéria, o legislativo é titular das condições em que essa matéria será organizada e o centralismo convergente de divergências na atual conjuntura determina inércia.

Não obstante, há um detalhe importante para análise, qual seja a criação de uma autarquia pela lei 10.233/01, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ), isto significando a delegação executiva e legislativa da competência para autorização, concessão e permissão de que trata o dispositivo constitucional (artigo 21, inciso XII), a um órgão com personalidade jurídica própria, patrimônio, receita e capacidade de autoadministração no cumprimento de respectivas atribuições.

A questão é por que o conteúdo da ora enredada Medida Provisória 595 de 06 de dezembro de 2.012, pendente pois, de ser aprovada como lei, não opera conteúdo através do órgão autárquico delegado, já que o posicionamento jurisprudencial vem somando essa possibilidade jurídica pelo acatamento doutrinário que flexibiliza o princípio da legalidade a favor do poder regulamentar dos chefes executivos?

Isso quer dizer que, regular licitações, condições contratuais, prazos e tantos itens ululantes na urgência provisória da medida em debate, é matéria regulamentar bastante cabível à ANTAQ e  é muito estranho nesse contexto, venham certas frentes políticas invocar a proteção de prazos contratuais, muitos atualmente sustentados por decisões liminares (judicialmente antecipadas), garantia de direitos de preferência ou a delegação de poderes licitatórios da autarquia a representantes de outros e privados interesses.

Com ressalva do funcionamento vinte e quatro horas dos serviços de desembargo da Receita Federal, Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e Ministério da Agricultura, esses sim como acréscimo interessante aos objetivos renascidos para a arte náutica e suas vantagens, há muita impertinência nas tais aglutinações feitas pela Comissão Especial de Deputados e tornadas oportunas pela Medida Provisória 595.

Talvez a explicação esteja em que se pretende centralizar pela Medida Provisória o poder atributivo da autarquia  à denominada “Secretaria dos Portos da Presidência da República”,  para a qual seriam transferidas as competências do Ministério dos Transportes e do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes estabelecidas em lei, no que se relaciona geral e especificamente a portos fluviais e lacustres.

Eis que a competência Constitucional de exploração dos portos propõe-se possa ser então delegada aos Estados, Municípios e Distrito Federal, o que de acordo com a Lei 9.277/96 do governo Fernando Henrique, já é matéria a ser intermediada pelo Ministério dos Transportes (alguma conexão?) mediante celebração de convênio.


Um fato interessante é que o modelo de criação de autarquias vinculadas a privatizações é bem típico da administração “tucana”, sendo de se observar que o presidenciável do partido inclusive já editou e promulgou lei estadual mineira para um denominado acordo de resultados com vistas a fixar domínio do poder executivo na regulação autárquica, estabelecendo metas operacionais e premiações (Lei Estadual 14.694/03).

Apenas reflexões e deflexões para os nossos olhares ao mar e nossos pés no chão porque, por experiência ou por falta inversamente proporcional desta, com efeito, não se enxerga bons ventos a favor do povo.


Jussara Paschoini

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