segunda-feira, 10 de setembro de 2012

A CONVENIÊNCIA DA INEXISTÊNCIA VIRTUAL






A já não tão inovadora possibilidade de guiar ações virtuais aponta para exposição instantânea de um grande número de vontades facilitadas e simplificadas por não existirem de fato e por isso mesmo favorecerem ao experimento inconsequente. Entretanto, tal não leva à conclusão de que o virtual seja sempre continente de uma causa destituída de efeitos. Relacionamentos virtuais, compras virtuais, cursos virtuais, livros e textos virtuais, filmes, espaços publicitários, enfim uma enorme gama de canais disponíveis põe a mostra um meio de comunicação dos mais eficientes, com oferta de material ideológico variado e rapidez.

Sem o óbice de notar a inserção alienada e acidentada pelo mero consumismo massificado enquanto essencial à óbvia e retumbante crítica à vida virtual, seria involutivo desconsiderar a base potencial do instrumental tecnológico a favor de superar limites físicos, espaciais e temporais atendendo ao ânimo das pessoas claramente intencionadas em interagir.

Partindo desta visão cabe invocar que o racional e o emocional continuam fundamentais ao subjetivo, tanto na sua sustentação quanto na instauração de suas experiências, inclusive as virtuais, aliás, permitentes a alçar vontades menos limitadas e satisfações mais imediatas, não significando isso a necessária queima de etapas lógicas como imponente digital dissonante de uma vivência integrada.

O virtual é essencialmente presente e daí a sua insuficiência em termos de existir como experiência total já que não exatamente possui um passado identificável ou um futuro efeito. Podemos encontrar água no mais belo copo de cristal virtual, mas ela não proveio de nenhuma nascente genuína e nem matará a sede, muito embora possa traduzir, talvez e até melhor a sensação de conforto e saciedade pretensa ao momento num contexto conotativo relevante.

Desta disposição ao momentâneo e ao imediato são identificáveis dois possíveis rumos da ação virtual: o de se perder na falta de realidade ou o de ficar represada no ser ativado apenas parcialmente em termos de efetivar sua experiência, donde surge um alerta para a inexistência bastante característica da conveniência experimental destituída de efeitos e, portanto, livre de vínculos e de fluidez neste tipo de “universo paralelo”.

Há que se salientar, por outro lado, que a máquina virtual garantiu em termos matemáticos e de marketing a suficiente vinculação de seus usuários diante da perfeita possibilidade de tornar eletrônicos tanto os créditos e débitos quanto os demais exponentes de relação numérica elaborada por experts, tudo numa clara evidência da concreticidade da reponsabilidade jurídica cogitável em termos de contraprestações obrigacionais relacionadas. 

Internet deveria ser plena de velocidade e gratuita ou pelo menos muito barata em face das vantagens acopladas aos megabytes disponíveis e não sustentáveis por si só.

É, contudo, o instrumento virtual interativo subjetivo e objetivo para efeitos cognitivos de toda ordem individual e social, o fato interessante para avaliar a experiência enquanto relação entre causa e efeito em termos da evolução de propostas potencializadas pela obstusão de oferendas digitalizadas do livre acesso à informação, circunstância nem sempre atrelada à assimilação e realização plausível.

Visível em termos virtuais é a instituição de causas potencializadas sem efeito próprio porque efeito não é característica desse instrumento, mas de quem o guia e isso significa que a intersubjetividade descomprometida simplesmente traduz inexistência tanto do ponto de vista ético quanto do ponto de vista moral, ou seja, tanto de caráter individual quanto social, respectivamente.

A incompletude da experiência estanque no universo virtual não se disponibiliza efetivamente contrária à violência, não se ativa em qualquer finalidade e não ultrapassa a necessidade teórica para a possibilidade de mudança, a não ser que haja ação humana consciente.

Então, se a amplitude virtual acomodar a sensibilidade e isolar a vontade no campo das satisfações imediatas, o que é monólogo ou diálogo fica destituído da função de mediar teoria e prática e, por conseguinte, de realizar qualquer finalidade, “tomando o inócuo, o inofensivo e o passivo como moldura tecnológica para o consumo diário” (Norris).

O contraponto da vida real versus vida virtual opinará por regra moral sagrada numa lógica elementar e até precária, em justificar a prevalente manutenção do “status quo” crente numa opção justa aos verdadeiros fatos e até sacrifícios, ainda que não subsistam robustas razões para isso, ainda que se relegue toda a dedicação e iniciativa inteligente e sensível também intermediada pelo forte instrumental daquela última principalmente se for reflexo de indivíduos bem formados, conscientes e maduros em interação.

A inexistência ética e moral bem como a insuficiência gradual cognitiva enquanto efeito virtual não caracteriza sequer um episódio, porque não há transição e sim mera exposição mutante, disforme, cabível em qualquer aspiração, até nas mais involuntárias. Somente o abandono desse aspecto conveniente e ao mesmo tempo abjeto é adequado a conferir substância ao ser interativo na transformação da realidade, na apropriação das aberturas tecnológicas de forma atenta aos ímpetos de revolução e mudança nas relações humanas de valor edificante, capazes de efetivamente enfrentar as adversidades do egocentrismo e da hiper-reatividade pós-moderna sem prejuízo de compatíveis avanços. 

Jussara Paschoini

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