terça-feira, 19 de março de 2013

O LIMITE HUMANO DO DOMÉSTICO


 


Para quem pensa que a escravidão acabou nos movimentos abolicionistas insurgentes entre outros dilemas, da incapacidade de manter seres humanos sob absoluto controle para exata servidão e, se desapercebe até de que as conquistas feministas casadas com a autarquia dos valores patriarcais dependeu do suor das domésticas, saiba-se que a profissão caseira só foi reconhecida no Brasil em 1.972.


Ainda assim, quando da promulgação dos direitos dos trabalhadores pela Constituição Federal de 1.988, manteve-se o empregado doméstico com tratamento diferente dos demais, sem direito a horas-extras, fundo de garantia por tempo de serviço, seguro desemprego, adicional noturno, indenização por dispensa sem justa causa etc.


O protecionismo trabalhista em confronto com a desqualificação da exploração do trabalho sob moldes deterministas meramente utilitários e sem proposta evolutiva não é o que justifica a exclusão constitucional dos empregados domésticos, mas o critério da necessidade falando mais alto e o preço humano podendo ser cobrado descaradamente na tipicidade das reações em cadeia.


A tradição escrava só mudou de nome e o humano cada vez menos disposto, graças a sua natureza, está a se afastar da condição, contudo, não sem deixar o vazio do lar desarrumado, da família desorganizada, da roupa suja e da discussão iniciada sobre quem lava  a louça com consequentes atos de contrição.


Deixar de agir por necessidade para agir por interesse não favorece aos hábitos e nem a definição da riqueza para o definitivo da pobreza, mas sem dúvida faz valer mais a sagração ritual dependente dos humildes até o limite da humilhação, além de perdoar só e no mais das vezes, as prostitutas, jamais os vagabundos.


Fato, para os empregados domésticos a humilhação esta ficando cada vez mais difícil e para nossa sagrada tradição, o remédio é instituir poderes de feição renovada, um refresco ácido para o sufoco de nossas comodidades e resguardo de particulares créditos morais conquistados a duras penas, daí a inevitável correção legal à caminho.


Juridicamente falando, o empregador doméstico não é empresário, não possui controle de pontos e não possui outros funcionários para ratificar e atestar o horário de trabalho da única mão de obra “brega” que contrata, donde a proteção relativa a eventuais explorações excedentes do horário, ficará a critério de posicionamento jurisprudencial diante da hipótese de qualquer contradição litigante.


Os demais direitos decorrentes de tardia “isonomia” deverão ser documentados em recibos e cártulas oficiais dificultosas para quem não possui um departamento burocrático com a finalidade de assegurar aprazadas e diversificadas formas de registro e pagamento.


Resultado, afora a diarista, assim considerada aquela que presta serviço por no máximo duas vezes por semana (há o que decrete uma vez só), complicou-se ao nível da ilegalidade a ordem dos lares, sítios e casas de praia com relação aos demais trabalhadores e talvez alguns grandes empresários.


A mão de obra escrava está acabando... no entanto, ainda não inventaram lei para acabar com a escravidão, porque papel e tinta podem até sugerir e não modificar atitudes ou transformar hábitos, as leis apenas os distinguem dos vícios para eventuais legitimações do poder sob forma de coação física ou moral. Quem pode realiza e quem deve se adapta, enquanto coriscos viram tragédias ou zigoto.


Jussara Paschoini

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