sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011
O Império do mediano (por Luiz Américo Camargo)
O que vou escrever aqui é vago, impreciso, impressionista; talvez até emocional. Mas sinto falta, entre os novos restaurantes de São Paulo, de alguém que queira ser ótimo, excelente. Por mister de ofício, vocês sabem, tenho que percorrer o que abre, o que reforma, o que muda de chef e por aí vai. Coisas que às vezes nem relato aqui, por irrelevantes. E, posso afirmar, há um grande contingente de coisas boazinhas. Medianas. Eu queria mais cozinheiros e chefs e garçons querendo ser muito bons.
O cenário gastronômico do cidade tem crescido e se diversificado. Certo, isso é óbvio. Olhando em perspectiva, num horizonte de quinze, dez, cinco anos, houve evolução. Mas ainda temos muitas coisas fracas; algumas boas; não muitas de alto nível; e um considerável número que fica ali, na média. Isso é um desastre? Não. Só que não é nada instigante.
Não estou falando num surto pessoal de tédio da profissão, nem do fastio de quem já não vê nada de novo sob o sol (e sob a chuva, diga-se). E nem estou afirmando que gostaria de ver mais gente trabalhando com alta gastronomia ou fazendo restauração palaciana. Não é isso. Queria ver mais gente cozinhando unindo gana e talento. Que seja para fazer um tremendo arroz com feijão e bife. Uma massa. Um prato luxuoso.
Estou falando de pretensão – algo que, quando bem direcionado, é muito bom. Que é fundamental para galgar patamares mais altos. Não “a pretensão artística consciente”, como diz Toni Massanés (da Fundação Alícia), pois esta pode ser um problema. Mas a pretensão de ser o topo de linha no seu ofício, na sua criação.
Por outro lado, se o mediano é o que grassa, é porque o mediano é aceito. Talvez seja o que o público ainda queira. E, do outro lado do balcão, talvez os profissionais – em sua maioria – não tenham condições técnicas de ultrapassar o teto. Ou talvez estejamos simplesmente no meio de um processo de amadurecimento (estou sendo ingênuo?). Mas nem por isso eu acho devemos abrir mão do bom, do belo, do justo.
Eu não acho que nenhum cozinheiro tem obrigação de ser tradicionalista. Eu não acho que ninguém tem obrigação de ser criativo. Entretanto, penso que chefs e restauradores deveriam ter o compromisso mínimo de buscar – por mais vago que o conceito seja – a sua verdade gastronômica. A alma da sua cozinha. Pode ser até que não encontrem (e muitos não encontram). Mas seria digno se procurassem.
Aliás, eu sei que estamos falando de empreendimento, de risco. Entretanto, penso que os restaurantes deveriam aproveitar melhor a sua liberdade, seja para trilhar que caminho for. Pois, cá entre nós, a maioria parece sempre seguir para um mesmo lugar – isto é, em busca daquilo que se apresenta como comercialmente mais viável. Mas será que ninguém questiona o fato de que, no tal ‘mesmo lugar’, já se encontra uma multidão (que não para de crescer) de estabelecimentos, disputando um público que, por sua vez, é limitado e não aumenta na mesma velocidade?
O restaurante pode ser apenas uma fonte de sustento. Pode ser puro negócio: vende-se comida, de um lado, obtém-se o pagamento, por outro. É legítimo. E isso me parece ainda mais claro naqueles estabelecimentos que abrem apenas para almoço, durante a semana, como alternativa para quem trabalha nos arredores. Pois ninguém está propondo nenhum tipo de ‘experiência’ nem de emoção ou epifania gustativa. É prestação de serviço.
Mas, uma vez que se optou por exercer a gastronomia com alguma pretensão, por que não canalizá-la na direção do melhor?
Digo tudo isso mais por anseio estético do que por fúria. Mais por apetite do que por indignação. O mediano também mata a fome. Mas não sacia a alma. Estamos precisando dos bons. Mais e melhores.
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