Bom selvagem e bruxaria com os seus devidos méritos, não é hodierno
reconhecer a figura do pagão no praticante de cultos sub-cristãos ou
sub-religiosos e nem tampouco se pode dizer do “paganus”, corresponder ele a
figura do camponês, fora da cidade, o migrante, o civil não politizado sem
muitos direitos a exercer afinal, depois da Declaração dos Direitos Humanos,
isso tudo é passado ou não?
Para ser mais
atual então, é coerente que dada à amplitude das descobertas que eclodiram no
pós-guerra se considere o pagão como resultado da diversidade e divisão do conhecimento
reflexos na aplicação prática utilitária da considerável gama de achados e
invenções elucidadas no século XX, o pagão robotizado, aquele que é isolado num
campo de regras de atuação único para atender as necessidades coletivas do
interesse econômico e ou político que estiver vigente.
Focalizado o
pagão desta maneira, é possível então buscar o seu divergente, observando,
contudo, que se trata também de um pagão porque estará também isolado, mas não
em um campo único de atuação e sim no etéreo campo das infinitas possibilidades
onde este flutua nas ondas móveis do efêmero, visível no indiscriminado convite
publicitário ao “novo”.
Os pagãos de
qualquer índole possuem uma única regra, estar fora da órbita, não ter pauta
nenhuma ou apenas a pauta que lhe couber no quanto for preciso à manutenção de
uma ordem dita segura, ainda que indefinida ou totalmente desconhecida.
Cada ciência ou
arte cria os pagãos de que necessita e estes concorrem entre si e para tanto
desenvolvem uma forma peculiar de apologia pagã libertária, participando ou não
de movimentos “antagônicos” ou não, pretensos de regrar o destituído de
sentido, o impensado, mas útil, o inconsequente, mas, apaziguante, daí o
absurdo de interpretar a igualdade como contrária às diferenças, quando em
verdade é apenas uma parte a se considerar para que cada um possa ter unidade e
por isso ser distinto em ação.
Toda ação
precisa ter uma base e um objetivo e o erro pagão está em que ou se despreza a
base ou se ignora o objetivo e o que é pior, os dois, portanto qualquer
regramento produzido nestas condições é fadado a precariedade e à insignificância.
Um exemplo
bastante interessante disso está na revogação da Lei de Imprensa pelo Supremo
Tribunal Federal em 2009, sob o argumento de que o diploma se tratasse de contrário
à liberdade de expressão, constitucionalmente consagrado.
Uma rápida leitura
no primeiro artigo da Lei 5.250/67 demonstra muito claramente que o paganismo
etéreo dirigiu a revogação da Lei, um diploma jurídico que dava feição aos atos
de imprensa e que permitia o confronto pelo exercício amplamente discriminado
do direito de resposta, embora a inércia culinária televisiva ditasse a
acomodação do interesse pela fome.
Afora o
paganismo etéreo houve também ativação do paganismo robotizado, onde para
garantir certas utilidades jornalísticas se pretendeu destituir a atividade de
qualquer embasamento científico identificador da respectiva atuação, o que
também não foi coerente.
Ora, qualquer
um pode escrever e publicar a exemplo do jornalista, qualquer um pode
fotografar e filmar também, assim como qualquer um pode discutir e estabelecer
o que entende certo ou errado, justo ou injusto, sendo que no primeiro caso,
isso não faz da pessoa um jornalista e no segundo caso um advogado ou juiz e
por aí vai ao infinito etéreo. Pode ser perigoso ser entrevistado por um pagão...
Não se despreze,
contudo, a incidental possibilidade da postura dissidente cabível a todo e
qualquer contato isolado ou difuso, com especial nota na característica
questionadora tendente a formação de opiniões enquanto marca sensível do
exercício intelectual vivificante.
Cada área
científica possui fundamentos próprios, ou seja, base, e se esta for ignorada o
pagão continua pagão com ou sem regra.
Por outro lado,
se for ultrapassada a base para fixar objetivos, aí o paganismo robotizado
ganha expressão além do adequado, sendo um problema para se observar na
apologia pagã a inversão da base pelo objetivo.
Voltando, pois,
à revogação da Lei de Imprensa, enquanto ato judicial fundamentado no etéreo
pela supressão, inclusive do direito de resposta, o que se tem para instigar o
compreensível é a recente decisão legislativa do Senado para retomar as bases
da profissão jornalística com a mera exigência de diploma, conforme o que
constava da lei revogada, entre outros motivos, por isso.
Sem adentrar na
questão da legalidade propriamente dita, onde um ato somente pode ser revogado
por outro de igual valor e o poder judiciário exerce o controle de
constitucionalidade, eis que, a despeito de qualquer consistência, o objetivo
foi fixado na base. Quer coisa pior que isso?
Não é o diploma.
É o conteúdo que identifica o básico de um exercício profissional distinto, assim,
o quanto foi definido historicamente como imprescindível ao ético e fundamental
da profissão assim patenteada e qualificada para ativar-se no mundo social, não
só pode como deve ser garantido por lei, no caso, inclusive, pelo depreciado e
caducante direito de resposta.
O diploma
jurídico que tratasse a imprensa não só poderia garantir como tornar verdadeiramente
exigível a liberdade de sua prática no terreno individual, mas qualificar
dentro de parâmetros razoáveis o distintivo da atividade vinculada do
profissional jornalista, que seguramente não é o diploma, assim como ocorre com
o direito, passa a ocorrer com medicina e tantas outras ciências que, possuindo
códigos de ética próprios, estão a exigir aprovação de órgãos representativos
da categoria para o respetivo exercício profissional distinto.
Reste claro que
a representatividade para eventuais efeitos jurídicos não pode ser simplesmente
sindical, como soa a acontecer nesta lamentável conjuntura porque, o interesse de
classe do exercício profissional, enquanto integrante típico da mencionada
forma de representação é apenas uma parte do cabível ao interesse da categoria
e não o contrário.
O Sindicato é
pessoa jurídica constituída com fins de representação una de categoria e
interesses profissionais e os Conselhos e Ordens, são instituídos por Lei que
lhes atribui competência para regulamentar e fiscalizar sob enfoque próprio o
exercício regular e ético da profissão correlata, uma circunstância diversa da lei
que em si já continha conteúdos tangentes à imprensa e a sociedade com vistas a
equilibrar poder da comunicação, principalmente dos veículos de massa (Lei
6.250/67).
A Lei de
Imprensa, de fato e de direito, interessava, ainda que ressalvas ou
modificações pudessem ser feitas.
Fora desse
terreno exemplificativo, há que se manter uma visão atenta à concorrência posta
em prática pela apologia pagã, observando que definidas as bases e garantida à
liberdade dos objetivos, enquanto plausível a qualquer consideração jurídica de
valor, a integração consciente de todas as áreas de evolução é consequência
otimista a substituir a muitas vezes suposta utilidade pela realização.
Adiante do
pagão e sua apologia está a crítica cujo potencial pode ser qualificado por
qualquer área do conhecimento e de acordo com a compreensão a que se
direcionar, o que não significa a ausência de base ou objetivo, mas
posicionamento rumo ao confronto edificante de salutares revisões e renovações
cogitáveis e praticáveis no plural terreno do livre pensamento e expressão
humana.
Jussara Paschoini
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