segunda-feira, 29 de abril de 2013

EMENDAS PIORES QUE O SONETO

 

Indivíduos racionais levam a conhecer-se por persuasão, podendo ou não acomodar certezas em dogmas cuja defesa ocupará respectivas mentes e atitudes no transcurso talvez de uma vida, tudo dependendo também de olhos, ouvidos e sentidos. É claro.
 

Diferente do dogma a regra não surge da persuasão individual, mas como necessidade das relações entre os indivíduos persuasivos e de acordo com as suas vontades diante de um propósito comum a estabelecer um senso superior de obediência em mutualidade de vantagens convencionais e razoáveis.
 

Ideologicamente, em sua visão mais evoluída, a generalidade da lei, mais do que a regra é equiparativa da possível persuasão individual para hierarquizar valores socialmente pertencentes a um maior grau de consensualidade no principal relevo da incolumidade física e moral suficiente a garantir a liberdade de escolhas, indistintamente a todos os cidadãos e eis a isonomia ou igualdade legal como princípio constitutivo do Estado de Direito e sua derivação lógica pela democracia.
 

A lei é graduada pela permissividade do que leva a conhecer como limite individual e nesse sentido, por organizar o poder do Estado a Constituição exige submissão dos governantes às regras do poder, visando mais do que limitar, substituir a vontade pessoal destes pela convenção hierárquica e potencial emanada do povo.

 
O maior equívoco constitucional é o personalismo insistente em perverter qualquer que seja o sistema de governo para elevação de mitos elaborados vaga e sorrateiramente na persistente seara dogmática característica da ativação político-partidária e ou religiosa, numa quase que derrocada de toda ideologia jurídica desenvolvida por séculos através da história com o intuito de preservar as regras e oferecer espaço para a realização individual.
 

O fato é que constantemente o que se vê é a personalidade dos líderes usurpando a ideologia por oportunismo fático, no transformar a individualidade persuasiva em exemplo moral para dirigir rumos redundantes em manter elevado nível de subserviência ao invés de propiciar o cumprimento finalístico essencial equiparativo da legalidade na preservação da liberdade reflexa pelo exercício de vontades confiantes nas regras permitentes por sua vez, de exceção e defesa bilaterais, e por isso mesmo diferentes dos dogmas mais convincentes, típicos da tirania.
 

O povo elegerá poderosos enquanto não subverter a noção perversa de poder, o que significa penetrar sem medo o campo das idolatrias mitológicas e emergir intrépido com a própria condição e anseio para exercer equilibradamente a sua persuasão, acatando limites congruentes e rechaçando o egoísmo exigente de desmoralização baseada em mera superposição determinista de epidemias sazonais em proveito de alguns poucos.
 

A Constituição da República Federativa do Brasil é moderna e corrigiu um de seus maiores erros ao ajustar direitos trabalhistas aos empregados domésticos, uma circunstância demandante, por outro lado, da adequação instrumental legislativa com a finalidade de propiciar e facilitar o empregador da mão de obra diferenciada, não empresário, a promover a documentação necessária no sentido de comprovar a regularidade jurídica finalmente conquistada pelo devido tratamento isonômico.
 

Isto observado, eis que a perversão do poder legislativo iniciou inovadora atividade sazonal baseada na corrente sustentação de incapacidades econômicas diversas, extensivas à maioria da sociedade, para distorcer a adequação da norma constitucional, buscando deliberar diminuições e descontos nos direitos dos trabalhadores domésticos não menores e não aprendizes ou estagiários.  
 

Esclarecendo, o Congresso Nacional começou a roer o próprio rabo numa vexatória busca de agradar gregos e troianos sem deixar de lado o poder de Roma.

 
De fato, numa visão menos getulista, todos os direitos trabalhistas poderiam ganhar a flexibilidade de não necessitarem da categoria impositiva por direito constitucional, desonerando as relações de trabalho para alcançar maior disposição de investimentos com a contrapartida de atender melhor a particularidades de cada trabalhador em termos de fixar condições que lhe fossem mais vantajosas diante mesmo das fontes e frentes governamentais.
 

Todavia, tal intervencionismo oriundo de período ditatorial teve o providencial escopo justamente de operar na defesa dos menos favorecidos em vontade e mantém-se pelo mesmo motivo até que se cumpram dispositivos isonômicos paradoxalmente desrespeitados pela carta magna, como bem demonstra o caso dos empregados domésticos em comento aqui reiterado acerca de nossa "modesta" submissão ao perverso.

 
Merece contemplação de passagem o outro intento legislativo com destino a balizar interpretação constitucional capaz de repugnar a atuação investigatória do Ministério Público para exclusivizá-la à Polícia pela ingerência apenas dos delegados, extremando reflexo político oportuno ao resultado insatisfatório daquela atuação contra outras e maiores autoridades públicas, mediante solavanco convencional supercategorizado por projeto de emenda (PEC 37).
 

Na prática, o Ministério Público possui atribuições de autoria de ação judicial, entre outras, de fiscalização legal principalmente no âmbito processual onde hajam interesses públicos a defender e resguardar, conforme disposição legal, o que, para o específico caso das ingerências investigatórias dirigidas às autoridades maiores, certamente mereceu amparo extensivo das divisões de competências da Constituição, mediante jurisdição responsável pelo respectivo controle e admissão consequente no apreço e decisão de questões assim, específicas.
 

Não deixa por isso o Ministério Público de estar adstrito à legalidade de suas ingerências investigatórias vinculadas a um interesse assim permitente, qual seja, na seara pública plausível a tal equiparação coerente ao exercício do poder, mas que não pode como intentam algumas atitudes de representantes entusiasmados de suas atribuições, estender-se a toda e qualquer situação difusa em sociedade, sob pena de horripilante desrespeito aos princípios do contraditório e devido processo legal a quem não detém explícitos poderes perversos sob suspeita.
 

Pelos desmandos perceptíveis nas emendas piores que o soneto, vem agora o poder legislativo pretenso de emendar a Constituição Federal para adquirir poderes modificativos do controle concentrado de constitucionalidade pertencente ao Supremo Tribunal Federal.
 

Para tanto o proponente do projeto de emenda aponta o ativismo do poder judicante contra o poder legislador, o que em tese poderia ser debatido nas esferas regulamentares e administrativas presentes nas instituições pelas vias de relacionada corregedoria e mesmo do apontamento individual de membros praticantes de arbitrariedades comprováveis mediante tramites internos cuja disponibilidade é sempre digna de ser invocada por quem de direito com a frequência cabível.
 

Jamais, porém, por força do próprio poder constituinte, a casa legislativa poderia sequer cogitar interferência na tripartição de poderes por não ser essa disponível a emendas, conforme artigo 60, § 4º, inciso III da Carta Magna, tratando-se de cláusula pétrea para inequívoca submissão a menos que haja promulgação de outro instrumento legítimo para regência do Estado, ou seja, uma nova Constituição, o que não é o caso.

 
O método de divisão de auto regulação de poderes estatais tripartites,  efetivado em moldes clássicos da elaboração de Montesquieu e que como tal prevalece como alvissareira ideal em muitos países, assim o é no sentido de coibir a perversão do poder enquanto friso  por ora objetivado e para simples registro de incontida opinião e exercício de individual persuasão, como de direito.

 
Ocorrências como as expostas, somadas a uma forma burlesca e hagiográfica de presidencialismo personalíssimo admitido repetida e constantemente  no tangível mundo ocidental dogmatizado, onde os poderes servem-se ou desvirtuam-se uns aos outros na brecha das marginalidades e marginalizações sociais em desfavor e a despeito da evolução jurídica compatível com os novos tempos, precisam ser vistas e conscientemente repelidas para efetivar conquistas e não desmerecê-las pela desordem.   

 

Jussara Paschoini

 



segunda-feira, 22 de abril de 2013

OS DANOS JUVENIS



Nossa sociedade acredita em vingança porque é reação natural diante do mal feito. Isso e muita outra coisa nasce  e cresce conosco e nem por isso é a pontual intersecção ao nosso modo de conduzir as ocorrências e muito menos o desgosto.


Não é também que nossa natureza possa ser negada. É que amadurecemos e evoluímos e o mundo atual é um retrato incontroverso da moção de nosso estado primitivo para os mais diversos aperfeiçoamentos, inclusive do senso de vingança transmutado em justiça como conquista, um dos frutos da tensão vital entre reação e ação na condição importante à existência individual e coletiva em suas intrínsecas empreitadas.


É maravilhoso ter a liberdade de relacionar emoção e razão quando isso não nos expõe à decepção, por isso valorizam-se as certezas e estabelece-se indiferença quanto ao duvidoso ou à busca de respostas variáveis como demais costuma ser o próprio viver, principalmente quando se está nos primórdios da juventude.


Pior que a incapacidade de prover o próprio sustento, o maltrato muitas vezes proveniente da impaciência de quem acha que já viveu o suficiente e a humilhação de não ter muita utilidade, é a indiferença imposta à juventude quando da imponente oferenda de um futuro melhor a despeito da necessidade de oportunidades para se descobrir.


Aqueles para quem as certezas estão mais disponíveis partilham  muitas vezes a mesma frustração na conquista de vagas supervalorizadas nem sempre correspondentes ao que se pudesse cogitar sequer como autêntico desejo e aqueles que vivem de incertezas natas ficam no desalento de no mínimo ter por onde começar, numa sucessão de portas fechadas, em conclusões descabidas para uma fase da vida apta a acessibilidade de numerosos pontos de vista.


Todos têm direito a uma margem de erros escusáveis. O jovem precisa errar e se isso não causar um tumulto exagerado, passa e é fundamental para ganhar confiança, senso de medida, noção de si e não de um futuro sem dono ou carente de dono.


A proteção à infância e juventude é obrigação extensiva a toda a sociedade, é dever de todo o cidadão e como a lei é feita para abranger a todos indistintamente, o jovem, menor, incapaz (para atos da vida civil) ou inimputável (para imputação e cumprimento de pena por crime) se define pela idade, com marco expressivo aos dezoito anos.


Cumpre salientar que pela Consolidação das Leis do Trabalho em termos atuais, o trabalho como empregado é permitido a partir dos dezesseis anos num aumento do limite que perdurou até emenda constitucional efetivada em 1.998, o de quatorze anos, o qual é vigente somente para o exercício da condição de aprendiz, prevista para tanto.


O contrato de aprendizagem do menor entre quatorze e dezoito anos tem destino de profissionalizar, associar ensino à prática mediante remuneração que não deve ser inferior ao salário mínimo computado por horas trabalhadas em jornada máxima de seis horas diárias exceto para quem eventualmente tiver concluído o ensino médio, autorizado à jornada de oito horas com intervalo de uma hora para descanso e refeição.


O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço é de 2% da remuneração e há direito a indenização na dispensa sem justa causa,  situação distinta da ocorrida quando do término do contrato de prazo determinado de no máximo dois anos e ou quando do alcance da idade de dezoito anos pelo aprendiz.


É de se frisar o emaranhado jurídico de fixação de faixa etária para considerar na condição jurídica do menor haver assunção de certos direitos e deveres acatados na órbita de plena validação e produção de efeitos, fazendo emergir a questão da responsabilidade penal deste quando infrator, considerando a gravidade dos delitos e condutas precocemente colocadas em prática sem a contrapartida penitencial ainda remanescente da conjuntura em vigor em todo o mundo criminalizado.

Primeiro, é bom lembrar que o menor infrator por lei é sujeito à medida socioeducativa em regime de internação ou de semiliberdade, matéria colocada em prática por instituições do tipo Fundação do Bem-estar do menor (FEBEM), atual Fundação Casa,  havendo  também a Fundação de Atendimento Sócio Educativo (FASE), conforme seja definido em legislação dos estados federativos para renomear e tentar redefinir os preceitos dedutíveis da necessidade pedagógica acoplada à medidas restritivas com vistas a reabilitar o menor.


Fato, as instituições socioeducativas são pequenos presídios cujos objetivos e responsabilidades custam caro ao governo e não surtem resultado. Não é outro o interesse dos governantes estaduais em legitimar de vez a prisão dos menores infratores para equipará-los a sujeição ”Carandiru” e reduzir a margem de insucessos institucionais no dificultoso cumprimento do Estatuto da Criança e do Adolescente.


A sociedade quer vingança. O governo quer menos responsabilidade e assim as penas vão se tornando maiores e mais abrangentes enquanto as causas da criminalidade vão se mantendo nas famílias novelísticas, trágicas , sem noção de responsabilidade paterna e materna sagradas para reagir a um mundo de perigos sustentáveis donde urge uma minoria juvenil e teratológica imponente de dor e guiada, como não poderia deixar de ser, pela indiferença.


O tratamento legal ao menor infrator não pode mais ser indiferente e nem o tratamento dado às famílias das vítimas dos respectivos crimes. Correção e compensação são faces de uma mesma moeda jurídica e um pouco de visão e empreendedorismo pode promover condições legais e práticas para que o menor se reabilite aprendendo a dirigir a vontade que lhe restar para compensar a quem lesou, diminuindo ainda que temporária e simbolicamente, o desvalor arraigado em sua conduta. Desvalor resultante entre outras coisas, da redução à dimensão “celular” e indexada pelo poder de consumo daquilo que é denominado como dignidade humana.

Com efeito analítico, sem olvidar a reponsabilidade pública e administrativa do Estado, a responsabilidade civil e indenizatória é dos pais do menor até os dezoito anos de idade, responsabilidade esta denominada objetiva, independente de culpa, imposta por lei e perfeitamente postulável pelos ofendidos diante da reclamada criminalidade dos infantes ou jovens. Resta saber em tal contexto, da existência de bens daqueles, o suficiente para responder, ainda que minimamente pela devida e legal compensação. Isso como resposta simples ao básico entendimento das causas da criminalidade corrente.


Jussara Paschoini

segunda-feira, 15 de abril de 2013

A POLÊMICA DO PODER INVESTIGATIVO DO MINISTÉRIO PÚBLICO






   

O presidente da mais alta instância jurisdicional, o Supremo Tribunal Federal, declarou publicamente considerar um absurdo a proposta de emenda constitucional que visa obstar a ativação do Ministério Público na promoção de investigações instrutórias das ações judiciais cuja propositura é de sua competência, para fixá-la como exclusiva da polícia.

 
O Ministério Público é órgão administrativo engajado e composto por promotores, bacharéis em direito e concursados para promover fiscalização de direitos e ações judiciais de interesse público, conforme a lei, principalmente as ações destinadas à imposição de pena por crime, quando não se tratar de hipótese dependente de iniciativa dos interessados, nas denominadas ações penais privadas (para crime de calúnia, injúria, difamação, ameaça etc.).
 

A veemência do Ministro do Supremo visa salvaguardar o aplaudido bom êxito do processo do mensalão e outras iniciativas do Ministério Público envolvendo autoridades do poder constituído na condução dos respectivos inquéritos, os quais, constitucionalmente, são interpretados como não sendo de exclusiva competência da polícia.

 
A prática mais comum nos crimes de ação penal pública é que ocorrido o crime, o inquérito seja iniciado quer de ofício pela própria polícia, mediante notícia do cidadão interessado ou requisição do próprio Ministério Público ou da autoridade judiciária e ainda, mediante flagrante, neste ponto devendo ser dito que a controvérsia atual não gira em torno só da abertura do inquérito, mas da sua condução e continuidade.
 

A autoridade policial tem um prazo (com posssível requerimento de prorrogação) de 10 dias para concluir o inquérito se o acusado do crime estiver preso e de 30 dias se estiver solto ou sob fiança e a partir daí a autoridade judiciária, titular inclusive, da manutenção ou revogação de respectivas ordens de prisão, passa a presidir o interesse manifesto ou não pelo Ministério Público na instauração da ação penal (denominada denúncia) para produção de provas em juízo, portanto intermediadas por poder imparcial do juiz para decisão sentencial de aplicação de pena.
 

Há de ser observado que a instrução mediante inquérito é preliminar e toda a prova é revista e muitas vezes tornada a produzir para efeitos de atender o interesse do Ministério Público e do acusado respectivamente, o que por lógica leva a questionar a pertinência econômica dos custos de estabelecer mais de uma oportunidade probatória processual, em caráter preliminar quando da fase de inquérito ou pela prévia ativação de recursos contratados pelo Ministério Público, observando, inclusive, por característica legal que o inquérito deve ter curto prazo de duração, principalmente se o acusado estiver privado de liberdade.
 

É sabido que medidas de inspeção nos presídios e delegacias constataram a manutenção de muitas prisões efetivadas em caráter preventivo e, portanto, em fase meramente especulativa da culpa do denunciado em processo a perdurar por muitos anos. Isso não só pela falta de assessoria defensiva, mas pela demora no andamento judicial posterior à conclusão de inquérito e iniciativa da ação penal pelo Ministério Público.
 

Se o Ministério Público, tendo interesse como parte na prisão do denunciado, como já vem ocorrendo, não administrar em tempo hábil a efetivação de suas pretensões probatórias, o acusado sem defesa especializada e preso fica no aguardo de sentença final, o que corresponde à culpa caracterizada, no entanto, arrepia a lei nas hipóteses de comprovada inocência dos menos favorecidos por recursos de crimes eventualmente melhor sucedidos ou em condição primária.
 

Por que então, um órgão com atribuições jurídicas de autor dos interesses públicos e com poderes para requerer novas diligências quando for o intuito de corroborar com maior robustez a oferta de denúncia conforme artigo 16 do Código de Processo Penal, enquanto finalidade desta fase pré-processual (de inquérito de acesso bilateral aos envolvidos), encontra a necessidade de extrapolar suas já sobrecarregadas funções para antecipar a produção de provas que obrigatoriamente poderão ser refeitas ou oportunas à revisão quando da ação penal em si, conduzida e sob presidência da autoridade judicial? Argumento geral: Combate à corrupção.
 

Então, é plausível ao que alardeia o claro inconformismo com relação à ação política no sentido de fixar limite à ação investigatória do Ministério Público como “proposta da impunidade” (Proposta de Emenda Constitucional 37) que o interesse do referido órgão em fixar determinados fatos no tempo e prevenir ascendência de autoridades executivas e legislativas com relação à polícia possa ser mesmo prejudicado. Fato que traspõe a improbidade como ilegalidade a favor do arbítrio de uma das partes no processo penal, no que interessa pela presunção de maior honradez dos concursados promotores com relação aos concursados delegados em suas correlatas atribuições legais e pertinentes instrumentalidades técnicas.
 

Não é correto, no entanto, que neste diapasão, todo e qualquer cidadão comum esteja na esteira investigatória do Ministério Público para cogitável início e ou manutenção da persecução penal, um contrassenso de imprescindível vislumbre no contexto da outorga irrestrita desta competência (inquisitória pré-processual) cuja adequação a situações específicas atendidas pelo agente fiscal da lei ou promotor, precisa contar com apontamento regulamentar, ou seja, com lei, e não subsistir no ilimitado terreno das interpretações das essencialidades constitucionais.
 

Por outro lado, a resposta articulada na defesa da competência da polícia, trocando em miúdos, para simples entendimento, quer impedir um cão de guarda com uso de munição para elefantes, travando por disposição constitucional taxativamente delimitadora, a interessante especificação de trâmites que possam encaixar o interesse público à maior expressão investigatória mediante caracterizada necessidade e não por simples arbítrio do proponente da ação penal, o representante do Ministério Público.


Situações a serem especificadas como diferenciadas por conta de particularidades e poderes políticos ou econômicos capazes de comprometer o regular andamento institucional da ação penal, devem por conseguinte estabelecer formas cooperativas de investigação suplementada por mecanismos de mútua fiscalização, observando sempre que possível o princípio de acesso popular ou público a informações que valham o correlato interesse. 
 
 

Jussara Paschoini

 

segunda-feira, 8 de abril de 2013

DESORDEM ATIVISTA NÃO É MODO DE TRANSFORMAÇÃO



 

Nada mais convincente do que a prática para efetivamente responder a uma especulação e eis o que, do ponto de vista social diferencia o ativismo ordenado do ativismo baderneiro, obviamente, sem desmerecer o eventual lazer de certo grau de baderna assumida.
 

Problema surge quando a baderna sequer diverte e, arrogada na desordem, atrapalha, quando não causa danos a terceiros, traduzindo quase que um crime de bando (artigo 288 do Código Penal) que por apossar-se de bandeiras e frases ganha uma aparência legítima e submete a população a rever a noção do sacrifício em prol de alguma causa sem efeito sequer exemplar.
 

Assim, transformar ideias em atos de poder coletivo, além de mera ansiedade social, contagiantes interesses e sugestionabilidade, precisa medir o alcance de sacrifícios exigidos em proporção a efeitos alcançáveis em benefício do grupo ou da sociedade cuja defesa se pretende, sob pena de ser reatividade efêmera com resultados contraditórios e desfavoráveis subjacentes à falta de estrutura, identidade e capacidade interativa enquanto qualidades entusiásticas das realizações grupais.
 

A cruz destinada aos afetos e desafetos sociais confrontáveis tanto atrai curiosos quanto fiéis e adversários, portanto eleger exemplos de trucidação moral é mesmo uma faca de dois gumes, bem capaz de ferir por séculos sequentes a respectiva empunhadura.

Dias e meses de crucificação moral e muitos anos reeleição do alvo simbólico: eis o fruto do ativismo baderneiro de causas gladiadas com o facílimo grau de influência sonoro e visual ao alcance básico de qualquer matilha, rebanho ou manada determinada pela falta de rumo e reflexão.
 

A ordem social pressupõe evolução dos símbolos em benefício da realidade e o ativismo efêmero diferentemente do aberto diálogo e da livre formação de opiniões, contradiz na prática a finalidade transformadora, muitas vezes por desprezar a fonte especulativa no fixar de um mínimo que seja grau de continuidade a favor de uma causa de conteúdo apto a progredir.

 
Quando se trata de legalizar, por exemplo, é preciso especular o que já existe e o que falta em termos de regulamentação para postular um efeito para a causa institucional mediante projeto cuja iniciativa pode ser popular ou já estar em trâmite parlamentar. Isto feito, a coletividade passa a ter um anseio específico para se ativar, manifestando-se como parte do processo legislativo mediante reflexão de compatível nível de influência recíproca.
 

Cumpre então informar, de acordo com a Lei 9.709/98, promulgada durante o governo de Fernando Henrique Cardoso que o projeto de iniciativa popular deve contar com a ratificação ou assinatura de 1% do eleitorado nacional dividido entre no mínimo cinco estados membros e 0,3% do eleitorado de cada um deles para apresentação perante a câmara dos deputados e não pode ser rejeitado em face de simples necessidade de adequação formal ou técnica legislativa a ser devidamente suplementada a favor do interesse popular soberano.



 
De outra feita, observando a revisão do Código Penal, o Conselho Federal de Medicina, na contrapartida da proteção dogmática e muitas vezes religiosa do embrionário e da presunção absoluta e impositiva de anseios reprodutivos femininos, apresentou projeto de lei para descriminalização da interrupção de gravidez até as doze semanas de gestação, atendendo não só a preservação da saúde da mulher pela tempestividade adequada à autonomia de sua vontade como ao interesse público de controle da natalidade e preservação de recursos emergentes direcionados ao expediente de curetagem decorrente de abortos praticados ilicitamente.
 
Também merece observação a tendência legislativa “pastoral” no sentido de sagrar o embrionário extrauterino para impedir o avanço dos benefícios com as pesquisas de célula tronco pela guarda cerimonial do zigoto e equivalentes, numa visão esquizofrênica capaz de apontar cientificamente uma espécie de genocídio menstrual quando da natural e muito comum ocorrência  da dispensa  de óvulos fecundos.
 
Reste claro pois que a divergência possível para as mencionadas hipóteses não é pessoal, é também franciscana, Católica Apostólica Romana principalmente e é importante questionar o significado da malhação de Judas nesse contexto.


Prosseguindo, se o intuito é fazer cumprir a lei, então os casos em concreto precisam ser matéria cognitiva suficiente a reinvindicação, junto aos titulares executivos ou intérpretes jurisdicionais.

 
Para as uniões homossexuais é ilustrativo notar tanto o reconhecimento jurídico da sociedade de fato a produzir efeitos análogos aos do casamento em regime legal de comunhão parcial de bens, quanto a submissão da adoção eventualmente pretensa de filhos não naturais a processo judicial com preenchimento de requisitos independentes do estado civil, o que inclui solteiros adotantes.
 

Além de exigir uma diferença mínima de dezesseis anos entre a idade do adotante maior e o adotando, o processo judicial legalmente imposto cumpre de forma isonômica o mesmo trâmite jurídico de avaliação e deferimento, com a única ressalva de que se for conjunta a pretensão de adotar, além de se avaliar o ambiente familiar adequado e a união estável dos proponentes, o estágio de convivência deve apresentar avaliação satisfatória.
 

Não há impeditivo legal para a adoção por casal homossexual, devendo-se frisar inclusive que a lei conta com a possibilidade de um par adotante se separar no trâmite da adoção, sendo autorizado para a hipótese, após o estágio de convivência elementar de convívio obrigatório com o casal, a elaboração de um pacto sobre a guarda e visita do adotando como único requisito à conclusão adotiva se positivamente avaliada.  

 
Certo é, no entanto, que o processo de adoção é sujeito a critérios de avaliação discricionária, o que significa que os correlatos administradores jurídicos têm liberdade de opinar, segundo avaliação científica pertinente sobre a adequação do ambiente familiar e os motivos legítimos da adoção com predominância de vantagem para o adotado, independentemente da forma legal de união de uma adoção conjunta e reiterando que os solteiros também podem adotar.

 
Assim, é necessário saber o que falta, quando e de quem exigir efeitos para a união afetiva e familiar entre pessoas do mesmo sexo, a qual, aliás, independentemente de qualquer preconceito e mesmo eventualidade litigiosa, parece já estar ocorrendo e cada vez mais pela ativação dos verdadeiros interessados e não pelo apedrejamento publicitário de maus eleitos e desafetos a obstruir a visão de outras e mais nocivas influências retrógradas a efetivas transformações.

 
Jussara Paschoini

segunda-feira, 1 de abril de 2013

A POSSÍVEL COMPENSAÇÃO DA VULNERABILIDADE


 

A espécie humana nasce vulnerável, mais vulnerável que a maioria dos seres vivos.

 
Uma das maiores contundências da lenta maturação humana surge da longa experimentação da própria insuficiência em circunstância impressora do constante ímpeto de prevenir e antever riscos.
 

O primeiro motor da economia é a necessidade e o segundo a segurança.
 

Não é a necessidade que acumula recursos a favor do terceiro motor, o desenvolvimento, mas a segurança.
 

Nesse contexto de necessidade, segurança e desenvolvimento é possível focalizar o grande desafio de viver na sociedade do risco fundamental porque não é outro o desvio de recursos do bem comum para a violência subsidiária, enquanto sustentáculo dessa sistemática evolutiva, aliás em pleno vigor.
 

A fobia é mazela inexorável, ou seja, não se move a rogo e não é o mal do século, de fato, coexiste com a sociedade desde o seu mais primitivo momento tribal, desde a pré-história.
 

É simples notar que a modernidade tenha se dado conta da saturação securitária regente dos rumos evolutivos, passando a talvez refletir sobre o seu caráter patológico.
 

Também digno de atenção é que ao invés de relacionar a falha progressiva da seguridade fóbica à violência, se associa o entrave a preferências coletivizadas ou não, religiosas ou sexuais, principalmente.
 

O mundo continua dividido entre suportes do modelo familiar patriarcal e o resto que para se assegurar precisa legitimar contrariedades nesse modelo. Assim, o ”casamento” homossexual é o coringa da vez, a diversidade sexual repelida por praticamente todas as religiões e ordens sociais, quer seu banquinho entre os "homens de bem", num equívoco daqueles mais retrógrados cogitáveis.
 

As preferências individuais e diferenciadas só vão ganhar legitimidade quando o motor securitário aperfeiçoar funcionamento mediante redução de atritos violentos e para isso novos modelos precisam ser admitidos em funcionalidade própria e independente. O obstáculo permanecerá intransponível no absurdo de inserir peças novas em engrenagens velhas.
 

É insubsistente afrontar o conteúdo emperrado pela inserção de travas quando novos valores precisam ser agregados adversamente à violência e em prol da confiança, essa sim fundamental a senão extinguir, minimizar os riscos inerentes à natureza humana.



A tradicional juridicidade foi fundada pela ideologia da eternização de valores e vínculos e diante de diversidades ao preço de séculos para exteriorizar-se no mundo social. Houve legitimação de muitos meios jurídicos destinados a proteger novos vínculos, tendentes a afrouxar laços e permitir renovadas formas de relacionamento e confiança, portanto a sociedade de fato, a herança testamentária, o concubinato há muito estão disponíveis à vontade de outros modos de associação e manifestação legítima de vontades.

 

No entanto, isso cada vez mais quer seguir no rumo pregresso pela absorção, por exemplo, da sociedade concubinária num casamento muito mais vinculante do que uma oficial união com registro de separação de bens, no mais das vezes causa típica do mero "morar junto" , enquanto plausível fruto de intenções experimentais sem comprometimento patrimonial.

  

Constituir vínculos é muito importante, mas não é sanguíneo ou convencional o elemento primordial à desenvoltura de um empreendimento ou sociedade familiar. A confiança que segue no rumo indissociável das fobias securitárias sem abrir-se ao cultivo das experiências, aprisiona e atrasa o desenvolvimento quando não conduz ao equívoco da libertação com violência, daí a prisão "de fato" ser hoje o obstáculo entre o comodismo alienante e o progresso, porque a eternização é predominante na cultura.

 

Assim se nasce, cresce e vive no afã de aperfeiçoar-se o seguro e indissolúvel, a pedra filosofal, o prazer sem fim, a vida eterna, desconfiando de métodos não condizentes e marginalizando comportamentos inadequados até conduzi-los ao centro do redemoinho para compatível tragada no ridículo dos extremos aceitáveis, numa bela nádega exposta e disponível.
 

A infância bem vivida é a infância com pouca ameaça e muito espaço para perceptíveis caminhos e ritmos, onde a curiosidade possa crescer rumo a escolhas compensatórias da liberdade como conquista intrínseca e inalienável para o adulto.
 

Não se ensina ou se modela a liberdade, esta apenas faz compensar escolhas cuja disponibilidade estará, naturalmente, restrita a não violentar o semelhante, ainda que adverso em suas peculiares e não fáceis compensações e enquanto essa confiança não estiver no ar, lidemos com a poluição.
 

Não violência e confiança são indissociáveis a exemplo da fome e do alimento.

Seja então a confiança propícia a não violência pela adequação das livres escolhas e não o contrário, de forma a que nossa vulnerabilidade não nos limite ou nos descompense o gosto de viver.

 

Jussara Paschoini