Indivíduos
racionais levam a conhecer-se por persuasão, podendo ou não acomodar certezas
em dogmas cuja defesa ocupará respectivas mentes e atitudes no transcurso
talvez de uma vida, tudo dependendo também de olhos, ouvidos e sentidos. É claro.
Diferente do
dogma a regra não surge da persuasão individual, mas como necessidade das
relações entre os indivíduos persuasivos e de acordo com as suas vontades
diante de um propósito comum a estabelecer um senso superior de obediência em
mutualidade de vantagens convencionais e razoáveis.
Ideologicamente,
em sua visão mais evoluída, a generalidade da lei, mais do que a regra é
equiparativa da possível persuasão individual para hierarquizar valores
socialmente pertencentes a um maior grau de consensualidade no principal relevo
da incolumidade física e moral suficiente a garantir a liberdade de escolhas,
indistintamente a todos os cidadãos e eis a isonomia ou igualdade legal como
princípio constitutivo do Estado de Direito e sua derivação lógica pela
democracia.
A lei é
graduada pela permissividade do que leva a conhecer como limite individual e
nesse sentido, por organizar o poder do Estado a Constituição exige submissão
dos governantes às regras do poder, visando mais do que limitar, substituir a
vontade pessoal destes pela convenção hierárquica e potencial emanada do
povo.
O maior
equívoco constitucional é o personalismo insistente em perverter qualquer que
seja o sistema de governo para elevação de mitos elaborados vaga e sorrateiramente
na persistente seara dogmática característica da ativação político-partidária e
ou religiosa, numa quase que derrocada de toda ideologia jurídica desenvolvida
por séculos através da história com o intuito de preservar as regras e oferecer
espaço para a realização individual.
O fato é que
constantemente o que se vê é a personalidade dos líderes usurpando a ideologia
por oportunismo fático, no transformar a individualidade persuasiva em exemplo
moral para dirigir rumos redundantes em manter elevado nível de subserviência ao
invés de propiciar o cumprimento finalístico essencial equiparativo da
legalidade na preservação da liberdade reflexa pelo exercício de vontades
confiantes nas regras permitentes por sua vez, de exceção e defesa bilaterais, e por isso mesmo diferentes dos
dogmas mais convincentes, típicos da tirania.
O povo elegerá
poderosos enquanto não subverter a noção perversa de poder, o que significa
penetrar sem medo o campo das idolatrias mitológicas e emergir intrépido com a
própria condição e anseio para exercer equilibradamente a sua persuasão,
acatando limites congruentes e rechaçando o egoísmo exigente de desmoralização
baseada em mera superposição determinista de epidemias sazonais em proveito de
alguns poucos.
A Constituição
da República Federativa do Brasil é moderna e corrigiu um de seus maiores erros
ao ajustar direitos trabalhistas aos empregados domésticos, uma circunstância
demandante, por outro lado, da adequação instrumental legislativa com a finalidade de propiciar e
facilitar o empregador da mão de obra diferenciada, não empresário, a promover a
documentação necessária no sentido de comprovar a regularidade jurídica
finalmente conquistada pelo devido tratamento isonômico.
Isto observado,
eis que a perversão do poder legislativo iniciou inovadora atividade sazonal baseada na
corrente sustentação de incapacidades econômicas diversas, extensivas à maioria
da sociedade, para distorcer a adequação da norma constitucional, buscando deliberar
diminuições e descontos nos direitos dos trabalhadores domésticos não menores e
não aprendizes ou estagiários.
Esclarecendo, o Congresso Nacional começou a roer o próprio rabo numa vexatória busca
de agradar gregos e troianos sem deixar de lado o poder de Roma.
De fato, numa
visão menos getulista, todos os direitos trabalhistas poderiam ganhar a
flexibilidade de não necessitarem da categoria impositiva por direito
constitucional, desonerando as relações de trabalho para alcançar maior
disposição de investimentos com a contrapartida de atender melhor a
particularidades de cada trabalhador em termos de fixar condições que lhe
fossem mais vantajosas diante mesmo das fontes e frentes governamentais.
Todavia, tal intervencionismo
oriundo de período ditatorial teve o providencial escopo justamente de operar na defesa dos menos favorecidos em vontade e mantém-se pelo mesmo motivo até que se
cumpram dispositivos isonômicos paradoxalmente desrespeitados pela carta magna,
como bem demonstra o caso dos empregados domésticos em comento aqui reiterado acerca de nossa "modesta"
submissão ao perverso.
Merece
contemplação de passagem o outro intento legislativo com destino a balizar
interpretação constitucional capaz de repugnar a atuação investigatória do
Ministério Público para exclusivizá-la à Polícia pela ingerência apenas dos
delegados, extremando reflexo político oportuno ao resultado insatisfatório
daquela atuação contra outras e maiores autoridades públicas, mediante
solavanco convencional supercategorizado por projeto de emenda (PEC 37).
Na prática, o
Ministério Público possui atribuições de autoria de ação judicial, entre
outras, de fiscalização legal principalmente no âmbito processual onde hajam
interesses públicos a defender e resguardar, conforme disposição legal, o que,
para o específico caso das ingerências investigatórias dirigidas às autoridades maiores,
certamente mereceu amparo extensivo das divisões de competências da
Constituição, mediante jurisdição responsável pelo respectivo controle e
admissão consequente no apreço e decisão de questões assim, específicas.
Não deixa por
isso o Ministério Público de estar adstrito à legalidade de suas ingerências
investigatórias vinculadas a um interesse assim permitente, qual seja, na seara
pública plausível a tal equiparação coerente ao exercício do poder, mas que não
pode como intentam algumas atitudes de representantes entusiasmados de suas
atribuições, estender-se a toda e qualquer situação difusa em sociedade, sob pena
de horripilante desrespeito aos princípios do contraditório e devido processo
legal a quem não detém explícitos poderes perversos sob suspeita.
Pelos desmandos
perceptíveis nas emendas piores que o soneto, vem agora o poder legislativo pretenso
de emendar a Constituição Federal para adquirir poderes modificativos do
controle concentrado de constitucionalidade pertencente ao Supremo Tribunal
Federal.
Para tanto o proponente
do projeto de emenda aponta o ativismo do poder judicante contra o poder
legislador, o que em tese poderia ser debatido nas esferas regulamentares e
administrativas presentes nas instituições pelas vias de relacionada
corregedoria e mesmo do apontamento individual de membros praticantes de
arbitrariedades comprováveis mediante tramites internos cuja disponibilidade é sempre
digna de ser invocada por quem de direito com a frequência cabível.
Jamais, porém,
por força do próprio poder constituinte, a casa legislativa poderia sequer cogitar
interferência na tripartição de poderes por não ser essa disponível a emendas,
conforme artigo 60, § 4º, inciso III da Carta Magna, tratando-se de cláusula
pétrea para inequívoca submissão a menos que haja promulgação de outro instrumento legítimo para regência do Estado, ou seja, uma nova Constituição, o que não é o caso.
O método de
divisão de auto regulação de poderes estatais tripartites, efetivado em moldes clássicos da
elaboração de Montesquieu e que como tal prevalece como alvissareira ideal em
muitos países, assim o é no sentido de coibir a perversão do poder enquanto
friso por ora objetivado e para simples registro de incontida opinião e
exercício de individual persuasão, como de direito.
Ocorrências
como as expostas, somadas a uma forma burlesca e hagiográfica de
presidencialismo personalíssimo admitido repetida e constantemente no tangível mundo ocidental
dogmatizado, onde os poderes servem-se ou desvirtuam-se uns aos outros na
brecha das marginalidades e marginalizações sociais em desfavor e a despeito da
evolução jurídica compatível com os novos tempos, precisam ser vistas e
conscientemente repelidas para efetivar conquistas e não desmerecê-las pela
desordem.
Jussara Paschoini