segunda-feira, 1 de abril de 2013

A POSSÍVEL COMPENSAÇÃO DA VULNERABILIDADE


 

A espécie humana nasce vulnerável, mais vulnerável que a maioria dos seres vivos.

 
Uma das maiores contundências da lenta maturação humana surge da longa experimentação da própria insuficiência em circunstância impressora do constante ímpeto de prevenir e antever riscos.
 

O primeiro motor da economia é a necessidade e o segundo a segurança.
 

Não é a necessidade que acumula recursos a favor do terceiro motor, o desenvolvimento, mas a segurança.
 

Nesse contexto de necessidade, segurança e desenvolvimento é possível focalizar o grande desafio de viver na sociedade do risco fundamental porque não é outro o desvio de recursos do bem comum para a violência subsidiária, enquanto sustentáculo dessa sistemática evolutiva, aliás em pleno vigor.
 

A fobia é mazela inexorável, ou seja, não se move a rogo e não é o mal do século, de fato, coexiste com a sociedade desde o seu mais primitivo momento tribal, desde a pré-história.
 

É simples notar que a modernidade tenha se dado conta da saturação securitária regente dos rumos evolutivos, passando a talvez refletir sobre o seu caráter patológico.
 

Também digno de atenção é que ao invés de relacionar a falha progressiva da seguridade fóbica à violência, se associa o entrave a preferências coletivizadas ou não, religiosas ou sexuais, principalmente.
 

O mundo continua dividido entre suportes do modelo familiar patriarcal e o resto que para se assegurar precisa legitimar contrariedades nesse modelo. Assim, o ”casamento” homossexual é o coringa da vez, a diversidade sexual repelida por praticamente todas as religiões e ordens sociais, quer seu banquinho entre os "homens de bem", num equívoco daqueles mais retrógrados cogitáveis.
 

As preferências individuais e diferenciadas só vão ganhar legitimidade quando o motor securitário aperfeiçoar funcionamento mediante redução de atritos violentos e para isso novos modelos precisam ser admitidos em funcionalidade própria e independente. O obstáculo permanecerá intransponível no absurdo de inserir peças novas em engrenagens velhas.
 

É insubsistente afrontar o conteúdo emperrado pela inserção de travas quando novos valores precisam ser agregados adversamente à violência e em prol da confiança, essa sim fundamental a senão extinguir, minimizar os riscos inerentes à natureza humana.



A tradicional juridicidade foi fundada pela ideologia da eternização de valores e vínculos e diante de diversidades ao preço de séculos para exteriorizar-se no mundo social. Houve legitimação de muitos meios jurídicos destinados a proteger novos vínculos, tendentes a afrouxar laços e permitir renovadas formas de relacionamento e confiança, portanto a sociedade de fato, a herança testamentária, o concubinato há muito estão disponíveis à vontade de outros modos de associação e manifestação legítima de vontades.

 

No entanto, isso cada vez mais quer seguir no rumo pregresso pela absorção, por exemplo, da sociedade concubinária num casamento muito mais vinculante do que uma oficial união com registro de separação de bens, no mais das vezes causa típica do mero "morar junto" , enquanto plausível fruto de intenções experimentais sem comprometimento patrimonial.

  

Constituir vínculos é muito importante, mas não é sanguíneo ou convencional o elemento primordial à desenvoltura de um empreendimento ou sociedade familiar. A confiança que segue no rumo indissociável das fobias securitárias sem abrir-se ao cultivo das experiências, aprisiona e atrasa o desenvolvimento quando não conduz ao equívoco da libertação com violência, daí a prisão "de fato" ser hoje o obstáculo entre o comodismo alienante e o progresso, porque a eternização é predominante na cultura.

 

Assim se nasce, cresce e vive no afã de aperfeiçoar-se o seguro e indissolúvel, a pedra filosofal, o prazer sem fim, a vida eterna, desconfiando de métodos não condizentes e marginalizando comportamentos inadequados até conduzi-los ao centro do redemoinho para compatível tragada no ridículo dos extremos aceitáveis, numa bela nádega exposta e disponível.
 

A infância bem vivida é a infância com pouca ameaça e muito espaço para perceptíveis caminhos e ritmos, onde a curiosidade possa crescer rumo a escolhas compensatórias da liberdade como conquista intrínseca e inalienável para o adulto.
 

Não se ensina ou se modela a liberdade, esta apenas faz compensar escolhas cuja disponibilidade estará, naturalmente, restrita a não violentar o semelhante, ainda que adverso em suas peculiares e não fáceis compensações e enquanto essa confiança não estiver no ar, lidemos com a poluição.
 

Não violência e confiança são indissociáveis a exemplo da fome e do alimento.

Seja então a confiança propícia a não violência pela adequação das livres escolhas e não o contrário, de forma a que nossa vulnerabilidade não nos limite ou nos descompense o gosto de viver.

 

Jussara Paschoini

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