segunda-feira, 28 de maio de 2012

O SAGRADO DIREITO DE RESPOSTA





Advindos de uma antiguidade autoritária, de uma estrutura social patriarcal que até bem pouco tempo não dava aos filhos o direito de responder aos pais como retrato de boa educação, compreender e valorizar o Direito de Resposta é mesmo um desafio.

É por isso mesmo tão importante focalizar este direito, o qual, a meu ver, é o contraponto principal e necessário à liberdade de expressão numa sociedade democrática, além de um exercício acessível de equilíbrio das relações entre pessoas físicas e jurídicas.

Numa sociedade saudável e evolutiva, equilíbrio não merece treinamento apenas por parte de malabaristas, é, no campo das relações, um alvo a ser atingido mediante consideráveis esforços, continuamente repetidos tanto individual como coletivamente, dentro ou fora dos âmbitos litigiosos submetidos à oficialização jurídica processual.

Nas relações jurídico-processuais o direito de resposta é princípio de válida constituição e andamento do processo, como reflexo essencial do contraditório, ou seja, para as partes de um litígio, todas as ocorrências e iniciativas da outra e adversa, devem ser obrigatoriamente submetidas ao conhecimento por publicidade e oportunidade sequencial de resposta, em determinado prazo legal.

Não é, pois, exatamente nesta circunstância que o direito de resposta para efeitos de garantia individual, merece particular análise, porque, conforme já se disse, nas relações processuais a resposta é da essência correlata. Sem direito de resposta por quem de direito, o processo é mais do que temerário é inválido.

Como garantia individual o direito de resposta se encontra no artigo 5º, inciso V da Constituição da Republica Federativa do Brasil, assim como a liberdade de expressão no inciso IX do mesmo artigo. Direitos constitucionais apuradamente existentes não só como intangíveis à modificação, sequer por emenda constitucional, mas contrapostos em respectivas existências para equilibrar um ao outro.

É bastante lógico que a liberdade de expressão esteja para o direito de resposta assim como a soma dos quadrados dos catetos está para o quadrado da hipotenusa (Pitágoras), ou seja, por uma questão de igualdade.

Definida assim, a reciprocidade do direito de resposta com a liberdade de expressão, cabe então apontar o que releva, do ponto de vista jurídico, do primeiro para com o segundo, pelos exatos termos dos incisos V e IX do artigo 5º da Constituição Federal:

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

V- é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

IX- é livre a expressão de atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;”

                                                    O direito à resposta surge pois da ocorrência de um agravo, de uma ofensa capaz de incomodar a tal ponto o sujeito, que desse modo, dela se sinta imbuído, por própria aptidão, a fazer uso.

É de considerar que a ofensa e a aptidão própria à resposta são requisitos de sua prática, porque não se postula por direito cujo exercício se mostra desprovido de conteúdo, ou seja, só responde quem tem ao que e o que responder, caso contrário, se está diante do irrelevante ou mesmo de um indesejável agravante.

Quanto à liberdade de expressão, releva a não submissão das criações intelectuais, comunicativas , técnicas ou artísticas a qualquer prévia obstativa de ser exteriorizada ao público. O direito de resposta não antecede como não poderia anteceder a expressão que lhe dá origem e nem pode ser visto como tal.  É um direito para inibir em proporcionalidade a ofensa, daí a imprescindível igualdade a encaixar ambos os ícones constitucionais da individualidade em direitos.

A reparação civil em indenização, mantida como direito pela configuração de danos materiais e morais, nos termos constitucionais securitários do direito de resposta diz respeito a outro assunto. Trata da compensação de prejuízos em dinheiro, demandando mais do que a reação própria e pessoal à ofensa, mediante caracterizado enfraquecimento material e moral a ser comprovado como causado ao ofendido com vistas às consequências além da resposta ou independentes desta.

Deve ser observado, contudo, a robustez adequada a coroar a resposta como o mais digno direito de qualquer pessoa ofendida e contraposta à liberdade de expressão de outra, porque o íntimo da personalidade ou mesmo o concreto da materialidade ganham proporção e igualdade no pleno exercício desse direito equilibrando bastante a relação jurídica relevante a ambos.

A facilidade venal não deveria sobrepujar a reação de capacitados ao exercício da resposta cuja compensação em dinheiro por coerência estaria condicionada a passar por esse pertinente crivo antes de ganhar expressão probatória qualificada à configuração de prejuízos indenizáveis. Nem tudo é solúvel com dinheiro sob pena de se prostituir o sagrado valor humano, mormente quando levado às raias do litígio.

Confrontadas a resposta e a liberdade de expressão como direitos fraternos, cumpre então manifestar veemente insatisfação com o fato de as instâncias jurisdicionais haverem praticado tão infame ato de distorção jurídica quando da revogação da Lei de Imprensa pelo Supremo Tribunal Federal, no ano de 2009, em arguição de descumprimento de preceito fundamental promovida pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), a quem não se sabe por que, esta lei incomodava, já que o partidário Leonel Brizola da resposta fez reverberado uso como rezava a Lei 5.250/67, junto a gigante Rede Globo.

A argumentação revogadora da Lei de Imprensa, enquanto único diploma legal, afora o Código Eleitoral, materializando o direito de resposta, aboletou-se no comodismo da suficiente constitucionalidade do direito em comento e numa suposta origem ditatorial da Lei tida, a pedido do partido político, como afrontosa à liberdade de expressão, vez que editada na vigência do regime militar.

Erroneamente a Lei 5.250/67 com alterações feitas por regulares trâmites até 1985 foi retirada de circulação, deixando o direito de resposta à pneumática prática forense e a insubmisso poder jurisdicional que na linha do desuso popular acerca do sagrado à dignidade não quer perder tempo e nem raciocínio com “o fora do básico indenizatório”.

O direito de resposta tinha forma para ser exercido e mesmo assim era privilégio de alguns, políticos mesmo, agora é letra constitucional lânguida sem parâmetro aplicativo, conforme muito bem salientou o Ministro Marco Aurélio reclamando a lacuna jurídica no único voto divergente da decisão não unânime de revogar a Lei.

Foi no governo e sob o comando de Humberto Castelo Branco que a Lei de Imprensa foi editada. Poucos meses depois o aludido presidente morreu em um suspeito acidente aéreo. Militar que era, Castelo Branco defendia dentro dos parâmetros de sua época, a democracia com dizeres como: “As Forças Armadas não podem atraiçoar o Brasil. Defender privilégios de classes ricas está na mesma linha antidemocrática de servir ditaduras fascistas ou síndico – comunistas.”

Vejamos então o artigo primeiro da Lei de Imprensa :

“Artigo 1º- É livre a manifestação do pensamento, e a procura, o recebimento e a difusão de informações ou ideias, por qualquer meio, e sem dependência de censura, respondendo cada um, nos termos da lei, pelos abusos que cometer.”

Como a mais alta instância se arroga a revogar uma Lei com esta premissa mediante arguição de descumprimento de preceito fundamental por partido político?

O direito de resposta lá se encontrava muito bem previsto e detalhado entre os artigos 29 e 36, convalidando a rápida possibilidade de resposta do ofendido no mesmo meio de publicação utilizado na ofensa, para plena apreciação e prática jurídica. E agora nada mais. E só quem já esteve na dependência da apreciação de tal direito pelo judiciário, sabe, com raríssimas exceções e ressalvas respeitosas, quão pouca e dificultosa era sua aplicação aos pobres mortais, digo, figuras não televisivas ou políticas.

Os reflexos indenizatórios são hoje a medicação genérica cabível a quase todos os direitos, uma circunstância de se lamentar e muito porque efetivamente os valores de cada um estão traduzidos em moeda corrente, sujeitos a critérios oscilantes de mercado quando tão importante seria estivessem pura e simplesmente marcar o interior individual para a projeção de atitudes dignas, construtivas de uma sociedade respeitável em todos os sentidos.
 

Jussara Paschoini


















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