Advindos de uma
antiguidade autoritária, de uma estrutura social patriarcal que até bem pouco
tempo não dava aos filhos o direito de responder aos pais como retrato de boa
educação, compreender e valorizar o Direito de Resposta é mesmo um desafio.
É por isso
mesmo tão importante focalizar este direito, o qual, a meu ver, é o contraponto
principal e necessário à liberdade de expressão numa sociedade democrática,
além de um exercício acessível de equilíbrio das relações entre pessoas físicas
e jurídicas.
Numa sociedade
saudável e evolutiva, equilíbrio não merece treinamento apenas por parte de
malabaristas, é, no campo das relações, um alvo a ser atingido mediante
consideráveis esforços, continuamente repetidos tanto individual como
coletivamente, dentro ou fora dos âmbitos litigiosos submetidos à oficialização
jurídica processual.
Nas relações
jurídico-processuais o direito de resposta é princípio de válida constituição e
andamento do processo, como reflexo essencial do contraditório, ou seja, para
as partes de um litígio, todas as ocorrências e iniciativas da outra e adversa,
devem ser obrigatoriamente submetidas ao conhecimento por publicidade e
oportunidade sequencial de resposta, em determinado prazo legal.
Não é, pois,
exatamente nesta circunstância que o direito de resposta para efeitos de
garantia individual, merece particular análise, porque, conforme já se disse,
nas relações processuais a resposta é da essência correlata. Sem direito de
resposta por quem de direito, o processo é mais do que temerário é inválido.
Como garantia
individual o direito de resposta se encontra no artigo 5º, inciso V da
Constituição da Republica Federativa do Brasil, assim como a liberdade de
expressão no inciso IX do mesmo artigo. Direitos constitucionais apuradamente
existentes não só como intangíveis à modificação, sequer por emenda
constitucional, mas contrapostos em respectivas existências para equilibrar um
ao outro.
É bastante
lógico que a liberdade de expressão esteja para o direito de resposta assim
como a soma dos quadrados dos catetos está para o quadrado da hipotenusa
(Pitágoras), ou seja, por uma questão de igualdade.
Definida assim,
a reciprocidade do direito de resposta com a liberdade de expressão, cabe então
apontar o que releva, do ponto de vista jurídico, do primeiro para com o
segundo, pelos exatos termos dos incisos V e IX do artigo 5º da Constituição
Federal:
“Todos são iguais perante a lei,
sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País, a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
V- é assegurado o direito de
resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral
ou à imagem;
IX- é livre a expressão de
atividade intelectual, artística, científica e de comunicação,
independentemente de censura ou licença;”
É de considerar
que a ofensa e a aptidão própria à resposta são requisitos de sua prática,
porque não se postula por direito cujo exercício se mostra desprovido de
conteúdo, ou seja, só responde quem tem ao que e o que responder, caso
contrário, se está diante do irrelevante ou mesmo de um indesejável agravante.
Quanto à
liberdade de expressão, releva a não submissão das criações intelectuais,
comunicativas , técnicas ou artísticas a qualquer prévia obstativa de ser
exteriorizada ao público. O direito de resposta não antecede como não poderia
anteceder a expressão que lhe dá origem e nem pode ser visto como tal. É um direito para inibir em proporcionalidade
a ofensa, daí a imprescindível igualdade a encaixar ambos os ícones
constitucionais da individualidade em direitos.
A reparação
civil em indenização, mantida como direito pela configuração de danos materiais
e morais, nos termos constitucionais securitários do direito de resposta diz
respeito a outro assunto. Trata da compensação de prejuízos em dinheiro,
demandando mais do que a reação própria e pessoal à ofensa, mediante
caracterizado enfraquecimento material e moral a ser comprovado como causado ao
ofendido com vistas às consequências além da resposta ou independentes desta.
Deve ser
observado, contudo, a robustez adequada a coroar a resposta como o mais digno
direito de qualquer pessoa ofendida e contraposta à liberdade de expressão de
outra, porque o íntimo da personalidade ou mesmo o concreto da materialidade
ganham proporção e igualdade no pleno exercício desse direito equilibrando
bastante a relação jurídica relevante a ambos.
A facilidade
venal não deveria sobrepujar a reação de capacitados ao exercício da resposta
cuja compensação em dinheiro por coerência estaria condicionada a passar por
esse pertinente crivo antes de ganhar expressão probatória qualificada à
configuração de prejuízos indenizáveis. Nem tudo é solúvel com dinheiro sob
pena de se prostituir o sagrado valor humano, mormente quando levado às raias
do litígio.
Confrontadas a
resposta e a liberdade de expressão como direitos fraternos, cumpre então
manifestar veemente insatisfação com o fato de as instâncias jurisdicionais
haverem praticado tão infame ato de distorção jurídica quando da revogação da
Lei de Imprensa pelo Supremo Tribunal Federal, no ano de 2009, em arguição de
descumprimento de preceito fundamental promovida pelo Partido Democrático
Trabalhista (PDT), a quem não se sabe por que, esta lei incomodava, já que o
partidário Leonel Brizola da resposta fez reverberado uso como rezava a Lei
5.250/67, junto a gigante Rede Globo.
A argumentação
revogadora da Lei de Imprensa, enquanto único diploma legal, afora o Código
Eleitoral, materializando o direito de resposta, aboletou-se no comodismo da
suficiente constitucionalidade do direito em comento e numa suposta origem ditatorial da
Lei tida, a pedido do partido político, como afrontosa à liberdade de
expressão, vez que editada na vigência do regime militar.
Erroneamente a
Lei 5.250/67 com alterações feitas por regulares trâmites até 1985 foi retirada
de circulação, deixando o direito de resposta à pneumática prática forense e a
insubmisso poder jurisdicional que na linha do desuso popular acerca do sagrado
à dignidade não quer perder tempo e nem raciocínio com “o fora do básico
indenizatório”.
O direito de
resposta tinha forma para ser exercido e mesmo assim era privilégio de alguns,
políticos mesmo, agora é letra constitucional lânguida sem parâmetro
aplicativo, conforme muito bem salientou o Ministro Marco Aurélio reclamando a lacuna jurídica no único voto
divergente da decisão não unânime de revogar a Lei.
Foi no governo e
sob o comando de Humberto Castelo Branco que a Lei de Imprensa foi editada. Poucos
meses depois o aludido presidente morreu em um suspeito acidente aéreo. Militar
que era, Castelo Branco defendia dentro dos parâmetros de sua época, a
democracia com dizeres como: “As Forças Armadas não podem atraiçoar o Brasil.
Defender privilégios de classes ricas está na mesma linha antidemocrática de
servir ditaduras fascistas ou síndico – comunistas.”
Vejamos então o
artigo primeiro da Lei de Imprensa :
“Artigo 1º- É livre a
manifestação do pensamento, e a procura, o recebimento e a difusão de
informações ou ideias, por qualquer meio, e sem dependência de censura,
respondendo cada um, nos termos da lei, pelos abusos que cometer.”
Como a mais
alta instância se arroga a revogar uma Lei com esta premissa mediante arguição
de descumprimento de preceito fundamental por partido político?
O direito de
resposta lá se encontrava muito bem previsto e detalhado entre os artigos 29 e
36, convalidando a rápida possibilidade de resposta do ofendido no mesmo meio
de publicação utilizado na ofensa, para plena apreciação e prática jurídica. E
agora nada mais. E só quem já esteve na dependência da apreciação de tal
direito pelo judiciário, sabe, com raríssimas exceções e ressalvas respeitosas,
quão pouca e dificultosa era sua aplicação aos pobres mortais, digo, figuras
não televisivas ou políticas.
Os reflexos
indenizatórios são hoje a medicação genérica cabível a quase todos os direitos,
uma circunstância de se lamentar e muito porque efetivamente os valores de cada
um estão traduzidos em moeda corrente, sujeitos a critérios oscilantes de
mercado quando tão importante seria estivessem pura e simplesmente marcar o
interior individual para a projeção de atitudes dignas, construtivas de uma
sociedade respeitável em todos os sentidos.
Jussara Paschoini
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