Não sei de quem é a autoria dessa frase, se é que tem autor,
mas somando letras em palavras, me dou o direito de dizer sem indicar dono que
o homem é um animal que sonha.
Pensar seria um termo, talvez, mais apropriado, contudo, é
na capacidade de sonhar o ponto diferencial marcante na abrangência do
comportamento menos guiado pelos instintos naturais, a meu ver.
A pura razão nunca foi o maior guia da humanidade. Sem
atentar para os fundamentos religiosos, sempre presentes desde os primórdios, é
na mais alta modernidade encontrada a maior expressão da ilusão e do abstrato
nas escolhas do homem, o que resulta em inevitáveis reflexos na política.
Da importância extremada dessa característica surgem os
denominados direitos intelectuais, direitos autorais e direitos de marcas e
patentes, todos voltados a proteger a originalidade das criações, muito mais
fruto da capacidade de abstração do que do raciocínio lógico propriamente dito.
É visivelmente insuportável ao homem não receber mérito pelo
conteúdo por si criado já que isto promove imensa repercussão em prol do senso
de individualidade ou do ego.
Apesar dessa inegável verdade, não se pode deixar de notar
certa arrogância na crença individual de ser único na produção de uma ideia
quando tantos outros seres pensantes e ou sonhadores, possivelmente caminhem em
direções bastante semelhantes rumo a um produto mental qualquer.
A prova disso é a atração em massa para determinados
produtos, de tal sorte que a propriedade intelectual muitas vezes passe a valer
mais do que o próprio conteúdo material envolvido na obra. Um nome, uma forma,
um slogan, um estilo, tudo isso enquanto fruto da mente teórica e individual,
atrai um sem número de pessoas pelo contraponto da identificação coletiva,
circunstância demonstrativa de que a propriedade intelectual é submissa ao
passar do tempo, tendendo na medida de seu valor, a cada vez mais perder a
unidade pela popularização.
Há de se ressalvar o detalhe das criações revolucionárias,
cujos efeitos custam mais a atingir a coletividade, restringindo-se ao
conhecimento de poucos entendedores, porque estas, diferentemente, tendem a se
consolidar e ganhar feição histórica, dificilmente compensando seus criadores,
mas servindo, eventualmente, mais adiante, a valores de maior solidez em face
do impacto qualificado, só possível, como solução de outros esforços de atitude
relacionados.
Exemplo típico e bastante conhecido de criação
revolucionária é a arte de Van Gogh, para quem o talento rendeu grande
desespero e loucura, vindo, aos critérios de conhecedores e apreciadores
específicos, a se tornar uma obra de valor crescente e inestimável, muitíssimo
concorrida entre os afortunados adquirentes.
A criação pode ter efeitos em massa ou efeitos históricos,
todavia, em qualquer circunstância depende dos olhos e das atitudes alheias ao
criador.
Onde é, porém, para efeitos desse texto que os direitos
autorais e a reciclagem se cruzam?
Os direitos autorais e a reciclagem se cruzam no ponto em
que a sociedade de consumo ainda demanda a atração coletiva por publicidade e
embalagens, ou seja, não basta o produto e talvez nem que a sua qualidade seja
tão efetiva, mas embalagem ainda é fundamental, não só para carregar o
conteúdo, mas para informar e atrair sobre ele, principalmente se apresentado
por bem pensada autoria de design e publicitária posta em divulgação da mídia
predominante.
A mulher quer mais do que lavar os cabelos, quer beleza e
atração e não basta o shampoo, tem que ter um frasco especial, propaganda com
modelos transformadas por recursos tecnológicos no mais belo e inatingível
porte de cabeleira estonteante.
Não se compra um refrigerante, mas uma história de juventude
e saudosismo ao se escolher uma Coca-Cola.
O ser humano sonha constantemente porque precisa disso, mais
do que admite.
Problema é se esta peculiaridade tão emblemática qualifica
verdadeiramente, como seria de sua essência, a vida das pessoas ou é
simplesmente sugada pelas rotas cuidadosamente traçadas pela posse do capital,
forjando momentos passageiros de satisfação em objetivos vagos e perdidos.
Resultante, para constatações metafóricas ou não, é LIXO!
Muito LIXO!
Do ponto de vista governamental, informe-se que embalagem é
agravante do imposto sobre produtos industrializados e por isso se constata
inúmeras vezes o paradoxo de uma compra de mais unidades de um produto assim
embalado, diversamente do interesse comercial cabível, custar mais cara ou não
oferecer vantagem de preço, como era de se esperar.
Poluição, enchentes e muita revolta por parte de gente
natureba foram trazendo a visão de que tanto LIXO não podia continuar, mas só a
vantagem em termos de eliminar custos de matéria prima calhou com a ideia de
reciclagem, retomando a rota do capital pelo aproveitamento do trabalho
informal dos catadores e pela idêntica aquisição de insumos a custos
extremamente reduzidos.
É visível que a produção de LIXO ganhou incremento com ares
de ação sócio ambiental e óbvia a atitude de grandes empresas atreladas ao
poder público para oficializar a vantagem à custa do bolso e do trabalho do
consumidor.
As redes de supermercado já se empenham em “pegar” de volta
as sonhadas embalagens pagas e tributadas de volta e de graça para depois
revendê-las e cobram pelas sacolas (um pouco mais duráveis e potencialmente
menos destrutíveis) para embrulho ou transporte das compras.
Não seriam mais fornecidas as usuais sacolinhas plásticas,
retirando de circulação os invólucros conhecidamente muito reutilizados para empacotar
os excedentes ou LIXO.
A justificativa, a Lei de muitos Estados e Municípios para
combater o poluente saquinho de supermercado utilizado frequentemente, conforme
já se observou, para ser continente da alta produção de LIXO.
Para o LIXO, nem sacos biodegradáveis foram cogitados em
substituição dos invólucros utilizados. O que se encontra a altíssimos preços
nas grandes redes disponíveis nos centros urbanos são enormes sacos de
durabilíssimo plástico negro, talvez para que os alucinados consumidores
facilitem a coleta, acumulando mais lixo em casa antes de submetê-lo à
necessidade de dispensa junto aos serviços públicos.
Fato também é que garotos de boa aparência identificados em
camisetinha como “eu sou catador” já começam a assediar com postura fiscal a
clientela das redes de supermercado, oferecendo enormes sacos VERDES para
interessante coleta de lixo reciclável, de graça, para retorno junto ao
estabelecimento comercial. E quem não quiser ou não tiver tempo para se dar ao
trabalho, engole um peso plantado na consciência com merchandising e continua a
poluir, pelo menos na acepção de quem deixa de lucrar.
A reciclagem vernizada chegou para ficar, longe de atingir a
poluição ambiental pela raiz, é mais um disfarce, mais uma embalagem para o
homem que sonha em deixar um mundo melhor para as gerações futuras.
É preciso uma autoria e uma criação efetivamente capaz de
libertar o ser humano da embalagem, substituindo a energia cobrada nos moldes
atuais por maiores chances de realização e menos serviço ao prático lucro,
aperfeiçoando os conteúdos cabíveis aos sonhos na realidade.
Exemplificativamente, um mercado ecológico e econômico, em organizada
franquia, traria produtos de rotina, vendidos a granel, na quantidade desejada,
em invólucros ou embalagens de preço fixo e substituível mediante troca, como
ocorria antigamente com os vasilhames de refrigerante, além de possivelmente
engajar pessoal especializado em divulgar e distinguir cada produto colocado no
mercado, conforme interesse manifesto pelo consumidor.
Orientações de praxe sobre o produto poderiam ser mantidas
junto a cada setor de venda em letras claras e legíveis, diferentes daquelas
que ficam escondidinhas na embalagem só para constar.
E o poder público que assuma a disponibilização de coletores
de recicláveis de uma vez por todas, para no mínimo retornar ao povo o que lhe
é duplamente cobrado em embalagem e imposto.
Faltam medidas inovadoras capazes de traduzir melhor
aproveitamento tanto material quanto pessoal a favor da indústria como forma de
aperfeiçoamento do comércio numa economia menos agressiva e por isso mesmo
menos vulnerável pelo tamanho empresarial, o que significa a descentralização
das grandes redes e maior representatividade na balança, com a contrapartida de
produzir menos LIXO.
Ao invés de carregar o grande saco VERDE de recicláveis o
consumidor só carregaria a embalagem pela qual já dispendeu compatível preço,
na medida certa de seu interesse.
A criatividade almejada como expressão em direitos
intelectuais precisa alcançar os ideais humanos já bastante ululantes e
atraí-los à saudável modificação dos modos e conteúdos de consumo, fortalecendo
a figura do consumidor e tornando-o independente das mal fadadas leis
protecionistas resultantes de um constante engano público aproveitado por
interesses escusos e particulares de gente meramente gananciosa.
Não é preciso sacrificar os sonhos de um futuro melhor com
disfarces bem elaborados e muito menos deixar de sonhar, porque esse é o
principal diferencial a favor do evolutivo. Partir dessa premissa é sair dos
domínios efêmeros do egoísmo e alcançar espaço para equidade.
Jussara Paschoini
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