Quando se
fala em vício do ponto de vista jurídico, o principal elemento de consideração
é a vontade, ou seja, a norma visa proteger os atos de manifestação volitiva contra
enganos e defeitos desconhecidos. A isso
atribui o nome de vício, denotando negativamente sua existência à regularidade
e à validez na produção de efeitos. A oposição de vício caracterizado
compromete e desconstitui total ou parcialmente os atos jurídicos a favor da
parte inocente, daquela contra quem o vício ocorreu.
Da noção
jurídica de vício já surge desde logo a visão de que aos objetos não lícitos e,
portanto, não reconhecidos juridicamente, nada se opõe em termos de proteger a
vontade. Não há inocência quanto a objeto ilícito, não há inocência a favor do
usuário de droga tachada pela condição coercitiva totalitária de abstinência
obrigatória.
Não é pela
visão jurídica propriamente que o vício recebe maior expressão de análise, mas
pela subjetividade da dor e do prazer a produzir parâmetros pessoais na rotina
das pessoas ao buscar satisfação de suas respectivas necessidades e vontades,
sendo que à princípio a exclusividade de um ou mais elemento de satisfação em
detrimento de outros pode passar a constituir o foco do que se denomina vício.
O vício ou
mania em concepção popular trata da mera repetição exagerada de gestos e
atitudes e se torna transtorno na medida em que prejudica e causa danos ao
convívio com os outros, no entanto, as variáveis de convívio podem alternar
pela opinião a noção de transtorno, portanto a união pelo vício e pela mania
elimina os danos e prejuízos e muito diferentemente, intensifica sua prática
pela identificação, daí ser questão de opinião.
A opinião
pode perfeitamente tratar como rotina o que é vício e vice-versa.
É relevante
então apontar para o fato de que a relação entre vício e opinião é basilar da
política na fixação de rotinas legítimas e ilegítimas, no reconhecimento do
transtorno de dimensão social importante, todavia, há que se observar que a
legitimação do próprio Estado de Direito se dá pela opinião, donde se deduz que
quanto mais rígida for a intervenção nestes parâmetros, menos representativo e
mais autoritário o poder será fixado.
A proibição
por vício é proibição de opinião e só por isso será sempre autoritária ainda
que vise coibir transtornos, os quais, por sua vez, merecem contraposição pela
mesma via optativa, qual seja pela informação e pela clareza de uma boa
educação garantida a todos em igual oportunidade, desde e principalmente da infância.
Ao simplesmente
proibir, o Estado consagra sua incompetência em representar e em oferecer
oportunidades dignas para a formação e manifestação de diferentes opiniões,
criando ilicitudes e transtornos fora de qualquer alcance legal de forma a
implementar um grande espectro de coligações avantajadas pelo crime num fenômeno
paraestatal onde o vício se torna obrigação, na maioria das vezes sob pena de
morte. Trata-se da coerção despudorada, aplicável ao homem tornado cão.
Observada a
opinião diante do poder político e sua supressão pela coerção destinada ao
vício face à presunção de exagero e consequente transtorno, cumpre então observar
os objetos ilícitos, particularmente os proibidos, contra os quais a presunção
de exagero generaliza o transtorno, frente aos objetos lícitos, acerca dos
quais nenhuma noção de exagero se opõe como é o caso do álcool, do cigarro e de
muitos e diversos agrotóxicos quotidianamente levados as nossas mesas.
Todos os
exageros tanto dos objetos lícitos (principalmente os psicoativos) quanto dos ilícitos fazem presumir transtorno,
são como já se viu questão de opinião e merecem informações e controle acerca
de riscos potenciais, quase sempre não viabilizadas, no primeiro caso pela institucionalização
histórica de interesses econômicos e no segundo pela institucionalização
histórica de interesses políticos.
Da
institucionalização histórica de interesses políticos surge na relação entre
vício e opinião o preço da divergência, a valorização do risco, a compra da
aventura e a cotação monetária do crime, portanto, aos objetos ilícitos, o dinheiro
e mais nenhum outro valor e eis o porquê de o vício ser questão de opinião e
dinheiro e não de informação, controle e temperança.
É mais fácil
e nem por isso menos dispendioso relegar o exagero como assunto de educação e
saúde e torná-lo assunto de polícia.
É mais
conveniente compactuar com dogmas religiosos e não conscientizar ou auxiliar em
termos de maternidade e paternidade indesejada para facilitar o nascimento de
abandonados, consumidores de subprodutos de droga de letalidade mais rápida.
É lucrativo
vender veneno e loucura, caro ou barato, a quem o conhecimento faz doer a consciência
menos do que o bolso ou a quem o detox garante a fruição de “benefícios” à
longo prazo.
É coerente
dramatizar o prazer e a dor ao impossível para mitigar rituais e jogos do domínio da
mente, tornando o homem temeroso de sua própria vontade e arte, eliminando
oposições inovadoras do “status quo”.
É legitima a
morte de quem diverge a quem isso aproveita.
Jussara Paschoini
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