segunda-feira, 19 de agosto de 2013

A SÍNDROME DO AMOR PENSADO


Down em inglês significa para baixo, sinônimo de depressão e num texto com esse título, logo é possível imaginar uma fossa daquelas dignas de bebedeira com urubus sendo chamados de meus louros e outros augúrios do amor obsessivo.

Entretanto é a frase de Reuven Feuerstein quem define a tônica importante ao assunto: “Cognição e afeto são faces da mesma moeda transparente”.

Portanto, pouco se tratará do registro histórico do médico britânico John Langdon Down e a descrição da síndrome a qual este nomeia por haver lhe descrito cientificamente os sintomas em meados do século XIX, ressaltando-se para a causa respectiva a figura de Jérôme Lejeune, pediatra francês responsável pela descoberta da anomalia cromossômica, a trissomia 21, em 1.958, quase um século adiante.


  




















                                                             O autor da frase destacada teve um netinho portador da síndrome e partindo da difícil escolha entre aceitar ou não aceitar o ser com necessidades especiais, optou por aceitar o ser e modificar a noção acerca de suas necessidades, no particular aspecto do natural retardo cognitivo.

   À parte anomalias típicas da doença progeróide, envolventes de uma incidência de 40% de defeitos cardíacos, 12% de refluxo gastroesofágico e 50% de chances de ter filhos com a mesma doença, além de hipotireoidismo, alterações de ordem imunológica e possíveis neoplasias, interessa saber que a intervenção fisioterápica precoce desde os primeiros meses de idade atua quase definitivamente quanto ao déficit motor.  No Brasil uma em cada setecentas crianças tem a síndrome.

A expectativa de vida que em 1.989 era de cinquenta anos para o portador da Síndrome de Down, subiu para entre sessenta e setenta anos, circunstância demonstrativa do grande acerto científico que acolhe e trata a doença, principalmente junto a quem possui acesso facilitado pela ascendência socioeconômica.

Feuerstein acabou por alcançar o intento de levar o netinho a frequentar uma escola junto de crianças normais e a exemplo de Maria Montessori dentro da sobressalente linha piagetiana de ensino, por conta de buscar incessante e persistentemente corrigir o que denominou de estrutura rígida de raciocínio, desmistificou a falha de desenvolvimento estigmatizada na necessidade especial decorrente do retardo mental.

A “necessidade” do ponto de vista do professor e psicólogo foi apontada como inoperância vinculada à privação cultural a redundar em falta de mobilização cognitiva, enquanto demanda social guiada a engatar a tendência autônoma de remodelar a realidade e promover a sua modificação estrutural mediante contato transformador, ou seja, adaptabilidade.

O instrumental desta necessidade foi instituído por Feuerstein como EAM (Experiência da Aprendizagem Mediada) com vistas então a flexibilizar a capacidade de mudança, inclusive pelo que acena como reversibilidade das operações parciais, ou seja, permitir o reiniciar das funções sequenciais que organizam a percepção da realidade para diferentes graus de interação espaço temporal.  

O professor e cuidador, no caso, converte-se no mediador da experiência cuja tradução está na coleta de dados de cognição, elaboração desses dados e resposta cuja eficácia é testada em quantidade e qualidade pela regulação daquele (o mediador) no atribuir de significados e valores a gerar interesse, novos estímulos com ampliação irresistível ao aluno.

O mediador das necessidades especiais deve seguir critérios universais e situacionais, os primeiros partem da intencionalidade clara e seletiva de conteúdo expressa para estímulo; da reciprocidade enquanto abertura de canal por parte do aluno seguindo para a transcendentalidade no fixar de princípios generalizáveis para futuras relações, isso enquanto fertilidade ao alcance do ciclo de mediação. Os critérios situacionais são variáveis conforme o contexto.

Ao mediar significados e valores a experiência agrega ao extrínseco dos aspectos sociais e afetivos novas necessidades de aprendizado o que somado a permissividade e otimismo tem ação humanística de crença no potencial transformador capaz de levar motivação e sentimento de pertença suficiente ao equilíbrio entre individualidade e coletividade, realização e respeito ao bem comum.

O destino da experiência da aprendizagem mediada é elevação cognitiva melhor e mais bem elaborada não apenas por amor a quem tem necessidades especiais, mas por quem tem comuns e normais necessidades de aprendizado, de expansão dos horizontes de modo a acolher e compartilhar renovado nível de cooperação rumo à verdadeira educação, ao ensino plural na formação da capacidade moral compatível com o grandioso passado e o imensurável futuro de múltiplas escolhas e possibilidades.

 Jussara Paschoini

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