É quase cruel
dissociar a palavra sexo de prazer considerando-se o aparato natural tão bem
elaborado de sensações rítmicas fisicamente enlevadas num fenômeno pessoal bastante favorável e vital. Como chave da reprodução dos seres animais, observe-se porém
que nem todos são agraciados com a mesma percepção. As exemplificativas cotias revelam
uma prática dolorosa em geral conducente à imposição forçosa da cópula pelo
macho à fêmea entrementes ferida pelo órgão acima retratado (é espinhoso mesmo e com dente!) . Diferente do rato
marsupial australiano, da espécie Antechinus que depois de uma maratona
alucinante e compulsiva morre de cansaço e por queda da imunidade em dez dias,
deixando para sempre a diferida batalha para perpetuar a espécie emprenhando todas as fêmeas sofregamente encontradas
no caloroso prelúdio mórbido aparentemente extasiante.
Os racionais
são passíveis dos denominados desvios ou parafilias representativos de uma
sexualidade com tão extravagante diferenciação prática capaz de ocasionar
pouca ou nenhuma receptividade na direção "normal" do ato conjunto,
portanto a configurar o ingresso na esfera íntima de outra ou outras pessoas causando de mau a péssimo resultado.
Nem sempre a
parafilia está relacionada ao transtorno, ou seja, nem sempre é fadada a
subtrair satisfação alheia por meios indesejados, vez que pode ser restrita ao pervertido,
assim considerado em face de uma discrepância intensa com relação ao meio
social e que termina por reduzi-lo pessoalmente à extrema rejeição ou ao isolamento em grupos
diminutos de semelhantes eventualmente condescendentes.
Da rejeição
surge a falta de alternativa, a impotência e a compulsão enquanto fatores que
fazem possível enveredar para o vitimismo e o descontrole de conduta passível à
violência dirigida tanto à vida quanto à integridade de parceiros não
consensuais a quem se impõe o prejuízo da morte ou do trauma causado pela
invasão íntima violenta e ou repulsiva.
Quando se
ingressa no terreno dos crimes sexuais, numa visão moderna e atual, a gravidade
e o sentido repressor da lei visam justamente o pervertido extremo na parafilia,
cuja análise inseparável do contexto social representa potentes graus de
agressividade somados a presumível reincidência.
Se ultrapassada
a criminalidade pura e simples com a forte característica premeditada típica da
conduta delituosa bastante comum aos pervertidos, se adentra no terreno
patológico da alienação mental franca, ilimitada pois quanto ao efeito de
restringir, por razões de ordem médica, o retorno do indivíduo ao convívio social nas
denominadas medidas de segurança que não só podem como devem ser perpétuas às
hipóteses de maior gravidade como atestam os casos dos maníacos assassinos em
série ou os requintes de crueldade visivelmente perpetrados.
O pior e mais
árduo da análise dos crimes sexuais está na tênue linha separatória entre o típico
criminoso calculista, sociopata de exemplar comportamento disfarçado e o
claramente portador de doença mental, considerando que para o primeiro os
motivos agravantes tanto pela agressividade quanto pela reincidência são muitas
vezes maiores.
Dito isto,
cumpre lembrar que pelo lado das vítimas, antigamente eram elas discriminadas,
havendo graus de maior ou menor punibilidade ao agressor conforme a
característica da vítima como “mulher honesta” sopesando fatores como
virgindade ou estado civil e sendo expressa a menor consideração para com as prostitutas.
Hodiernamente
com o advento da Lei 12.015/2009, condensou-se o crime de estupro num único
delito que inclui no fato criminoso ou típico, homens e mulheres submetidos à
violência e ou grave ameaça não só à conjunção carnal como à prática de ato
libidinoso (manipulação libidinosa) cuja pena pode variar de seis a dez anos e
atingir a pena máxima de trinta anos conforme associado com resultado de lesão
corporal grave ou morte.
Deste modo
superou-se a grande discussão antes redundante acerca da dificultosa prova da
conjunção carnal, notando que a perícia ou exame de corpo de delito ainda que pela
constatação de lesões genitais, se sugeria ser amplamente refutada em termos de
caracterizar a ausência de consentimento e repulsa da vítima.
Não é que se
dispense o corpo de delito como importante elemento inquisitivo, apenas deixou
de ser e definitivamente essencial para caracterizar a prática de estupro, o
que remete à perícia psicológica tanto a vítima como o acusado , bem como a
outras evidências necessárias à imputação da pena de reclusão mínima de seis
anos. Nesse aspecto a reincidência de pessoa já acusada anteriormente pelo
mesmo crime ou similar agravará em muito a possível condenação. Mulheres não
são mais apenas vítimas, podem ser acusadas de estupro.
A harmonia e
desarmonia do consentimento sexual e o grau de perversão envolvido em integrar o
prejuízo da vítima, bem como a agressão do delinquente, são hoje producentes de
pena de reclusão com o mínimo de dois anos e quatro meses em regime fechado já que 2/5 da
mínima pena para possível progressão ao regime semiaberto para crime classificado como hediondo o que sobe para 3/5 nos caso de reincidência. Ampla
é a margem de interpretação jurisdicional tanto para compreender a relevância
da invasão íntima criminalizada e condenar quanto para absolver a pessoa
acusada. Isso à exemplo da amplitude que reverbera a validação de contratos na
órbita civil, sujeita a caracterização de abuso nem tanto por especificidades
legais mas por ampla abertura a interpretação dos juízes.
A vítima menor
de catorze anos faz presumir a ocorrência do estupro (estupro de vulnerável),
agrava diante disso a pena entre oito e quinze anos de reclusão e é crime
hediondo também.
O fato
tipificado como crime independe de violência ou ameaça que se presumem
ocorridas. Todavia, por questões de interpretação doutrinária, nenhuma
presunção fixada em lei é absoluta, admitem-se provas em contrário e novamente
fica a critério jurisdicional avaliar as condições entre o consentimento da
vítima e a perversão do presumido estuprador, estabelecendo-se contudo mais
forte imputação de pena quanto menor idade tiver a vítima e maior o grau de
perversão, agressividade ou fraude balizados contra o acusado.
A lei penal
tipificou como crime o assédio sexual equiparando em efeitos punitivos a
obtenção de favores sexuais aproveitada em virtude do quanto possa ser
interpretado como ascendência ou superioridade hierárquica, mas estabelece pena
menos grave de detenção (regime semiaberto) entre um e dois anos.
Aumenta de um
terço a pena por assédio sexual se a idade da vítima for entre catorze e
dezoito anos. No caso de estupro a pena parte de oito e vai a doze anos de
reclusão.
Causar
inconsciência e impossibilidade de reação como forma de burlar o consenso da
prática sexual também é modalidade de estupro.
A excessiva
incidência de estupros e mesmo de atos pedófilos estabeleceu vistosa margem legal
tanto para a caraterização quanto para a imputação condenatória pelos crimes
sexuais, amplificando principalmente o estupro no referente aos sujeitos ativos e
passivos. Contudo, os extremos da lei penal tendem não só a minimizar como a
maximizar rigores de análise probatória ao critério jurisdicional em
circunstância favorável à invocação das mais elevadas instâncias judiciárias
para a análise da matéria que por envolver forte restrição gravada à liberdade do direito de
ir e vir, enquanto máxima constitucional, se encontra bem mais apta ao pleno galgar
dos mais elevados graus, com culminância inclusive no Supremo Tribunal
Federal.
Há apenas
correlação lógica e não dependência entre os julgamentos por crimes sexuais e a
reparação indenizatória destes crimes nas instâncias civis.
Jussara Paschoini
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