Um curso
concorrido, um sonho de jovens, um talento de todos, o direito passa pela vida
e a cabeça de muita gente. Fazer Justiça é a bem-aventurança cristã, é prova de
bravura e de índole moral poderosa, não obstante, tão logo surja a profissão, a atividade
causídica em si, o conflito de razões inesperadas, com os trâmites burocráticos, a conferência interminável de condições e prazos processuais aos quais
sujeitam-se as partes e jamais os donos do poder decisório, muitas vezes
exercido ao bel prazer de egos cultivados no êxito concursal de anos
pós-faculdade; a beleza embaça e o herói perde o charme, vira a caricatura de
uma proposta enaltecedora.
Não é apenas
isso, também o estigma do indivíduo safado, driblador da lei, ladrão das
vontades sobre quem recai a morosidade dos sonhos que não se realizam a
contento e não sem sacrifício, certamente acompanhará o percussionista engajado
na defesa de interesses incisivos e esquivos, o tal advogado.
A porta do
purgatório e o advogado nela e quanto mais capacidade e eloquência, maior a suspeita, contudo, não seja esse profissional humilde, nada de franciscano, irmão sol e irmão lua,
advogado sem arrogância acaba virando padre e assim, diferente, só é notado em
sua falta de santidade quando a causa desanda e a certeza se perde para revelar o malandro de marca maior.
Se for mulher é
meio caminho andado para ser aproveitadora e deixar qualquer cônjuge sem as
calças na primeira oportunidade. Só a nobreza "de origem" pode livrar uma
trabalhadora da lei de sua sina dominadora, sua marca caçadora ou caçada. Ser
puta é muitas vezes mais nobre, não cobra jantarzinho, florzinha, perfuminho e
ora, não sabe litigar! É só vagina e preço! Honorários e divisão de bens e
despesas, nem pensar!
Não bastasse
tudo isso, a multiplicidade de exigências ao caráter de um advogado passa pela
linguística, porque deve desenvolver a tradição de brocados e o jogo falatório típico
da conservação e da categoria rebuscada, pretensa de qualquer interessado e ser nesta razão ridicularizado pelo visível desuso do estilo verbal e literário,
longe da leveza prazerosa típica do exercício profissional da palavra, o qual, por
conseguinte, se considera mais legítimo, talvez mais popular e por isso, mais honesto.
Muitos cursam o
direito, muitos são malandros de qualquer profissão, poucos advogam, porque
isso faz sofrer de um sofrimento que não tem nome, eira nem beira, o de tomar para si a dor e
as razões de outros seres humanos queridos ou achincalhados por suas
personalidades e atitudes, é ser espelho de uma vontade maior que não lhe
pertence e não tem nada de divina, é pura e simplesmente humana, com suor,
sangue e fezes.
De sobra, se
preserva por necessidade a riqueza do vocabulário a exploração dos recôncavos do
dizer, com efeito, de preferência os melhores para satisfazer o patrocínio de
quem quer que seja, o mandatário aceito e a causa que se abraçou para libertar
o humano ao custo de massa cinzenta e verbo forte para quem o verbo vale em
ação, literalmente.
Advogue, se
puder, porque não é mera questão de querer e muito menos de acertar, ou se é,
ou se fica imaginando ser no direito que nada é e pouco opera se submetido
apenas às razões predominantes de certos moralistas, pouco mutáveis senão pelo
verbo de quem se engaja a buscar e valorizar o confronto, ainda que isso
represente um caminhar caduco de soerguimentos e tombos nem sempre compensados
pelos ideais simplificados de felicidade e beleza, tão impossível para os chatos de
profissão descontente.
Seja advogado
se puder, porque isso implica, pelo nome, em comparecer, sem atraso, sempre que
chamado, ao lado de quem te evoca, e cobre, senão gratidão, a alma porque não
há dinheiro para a pobreza exigida pelo diabo quando escolhe uma posição que
nunca implicará em pernas abertas, mas em cabeça erguida e passos firmes diante
de pedras, trevas, fome e insônia, guardando o nada de si a favor de outrem.
Da inteligência
aplicada ao retardo de renegados, a palavra delineia uma ponte onde o passado e
o futuro da humanidade ganham expressão, e nela, existe um estúpido que te faz
acreditar porque pode, por direito, este é um advogado e sem ele, não se faz
Justiça e nem a visão do contrário. Isso mesmo.
Jussara Paschoini